Todo mundo, ou quase todo mundo, tem alguma lembrança que relaciona os avós à cozinha. Para quem teve sorte e encontrou na figura da avó aconchego e muita coisa gostosa, certamente vai lembrar de alguma guloseima feita por ela. A isso damos o nome de memórias afetivas, expressão muito bem usada na atual gastronomia para se referir à comida afetiva.
A Mirí Padaria e Confeitaria (@miriartesanal) localizada em Jaguaribe, respira comida de vó. Os proprietários, o casal Sara e Rômulo, tiveram o privilégio de conviver com seus avós e bisavós, todos eles com os pés bem fincados na cozinha. Eles já não estão mais presentes, mas várias receitas da padaria são literalmente dos tempos das vovós,uma cozinha verdadeiramente afetiva.
“Um dos lugares que a gente sempre busca inspiração é nas nossas próprias famílias, nas nossas próprias memórias, com as receitas que a gente temmuito carinho. A família do Rômulo tem uma relação muito forte com a cozinha. A avó materna dele, a avó paterna, a bisavó, ele sempre tem lembranças em relação a estar na cozinha, é um lugar assim muito forte”, conta Sara.
Se a família do marido tem as mãos totalmente fincadas na cozinha, a família de Sara não fica atrás. “Do meu lado, minha avó paterna era a cozinheira de mão cheia, grande parte das minhas lembranças são relacionadas a ela cozinhando”. E reitera: “Sempre que a gente procura criar algo, a gente tem esse lugar aí também como um ponto de referência para voltar, pensar e lembrar dessas avós”.
Nunca se falou tanto sobre a cozinha afetiva como nos últimos tempos. Segundo chefs e especialistas em gastronomia, a expressão começou a ganhar destaque a partir do século XX com o movimento Slow Food, que valoriza a alimentação local e sustentável associada às memórias afetivas relacionadas à gastronomia. A ideia de que comida é também emocional e sensorial começou a ter destaque nos discursos dos chefs. Eles passaram a criar pratos com lembranças embrulhadas em sentimentos, conectadas com família.
Provavelmente a partir daí percebeu-se uma mudança cultural com relação à valorização das histórias e tradições pessoais com relação à gastronomia, e a expressão "memórias afetivas" foi se tornando popular à medida que começamos a valorizar as experiências emocionais associadas à comida.
Esse tipo de valorização cabe de forma perfeita na história do casal Sara e Rômulo, que vivenciaram a comida em forma de afetividade verdadeira entre as grandes cozinheiras da família, as avós paternas e maternas.
Sara lembra muito bem dos vários momentos com a avó e a atmosfera de felicidade em lidar com a cozinha, das conversas sobre comida e os ingredientes “de verdade”, enquanto aprendia com a matriarca.
“Minha avó cozinhava muito e uma das coisas que ela gostava muito de fazer eram os bolos. Para ela, os ingredientes tinham que ser ingredientes de verdade. A gente ia fazer um bolo, uma canjica, um doce de leite, tinha que ser leite fresco, tinha que ser o leite de coco. Esse cuidado com os ingredientes é algo que eu carrego muito forte, que eu aprendi muito com minha avó”, afirma Sara.
“Lembro que eu perguntava: Vó, a gente não pode bater o ovo todo de uma vez no bolo? Ela respondia: 'De jeito nenhum! Você tem que bater primeiro as gemas e depois a gente bate as claras separadas para incorporar, para o bolo ficar fofo’. Esse cuidado, esse detalhe do processo de cozinhar são algo que eu levo até hoje. Eu via ela fazer as coisas com dedicação, cuidado e atenção aos detalhes, sabe?”
A família de Rômulo também tem grandes histórias de receitas que envolvem muito afeto. Uma delas é a rosquinha de coco. A cada mordida é uma viagem no tempo para o proprietário da Mirí. A receita sempre leva a lembrar da avó, que preparava essa delícia, e também do pai, que venerava a receita da mãe.
“Era um baita de um evento na hora que fazia a rosca de coco. Lembro da família toda reunida para poder ajudar, até porque era um batalhão de coisa para fazer. Não tem como não lembrar dela nesse momento. Meu pai amava a rosca de coco. A primeira receita que eu aprendi a fazer foi a rosca de coco por pedido do meu pai, pela saudade que ele tinha de minha avó”, lembra Rômulo, com muitos detalhes.
“Dos produtos que a gente tem aqui na loja que mais lembra nossos avós são a nossa rosca de coco, uma receita que foi inspirada na rosca de coco da avó paterna de Rômulo, Elisa; a gente tem também o nosso pão do sítio, uma receita inspirada no pão da bisavó do Rômulo, a vó Rosa. O nome se refere ao fato de que a bisavó dele morava em um sítio, no interior de São Paulo. Alguns clientes também acabam chamando de pão da fazenda, pão da família. Também tem o nosso bolo de coco, receita inspirada na minha avó, a avó Laíde”, conta Sara.
Com muito prazer, Sara conta o quanto fica contente ao explicar aos clientes sobre o fato de os produtos serem receitas antigas da família, que passaram de uma geração para outra.
“É muito bonito quando a gente diz para um cliente que aquele pão é uma receita da nossa família, que o bolo é uma receita da nossa família, e o quanto as pessoas ficam felizes em saber disso; ver elas gostarem muito de um produto e a gente poder explicar que foi algo passado de avó para avó, para mãe, sabe?”, conta emocionada.
Vamos celebrar essa história de família e as receitas envolvidas em grandes sentimentos, como devem ser as memórias afetivas na gastronomia relacionadas à avó, com a receita da rosquinha de coco tão celebrada por Sara e Rômulo, oferecida na Mirí Confeitaria e Padaria.
Rosca de Coco-Rendimento: duas unidades de 600g
Massa:
- 500 gramas de farinha de trigo
- 10 gramas de fermento biológico seco
- 8 gramas de sal refinado
- 50 gramas de açúcar (refinado ou cristal)
- 30 gramas de manteiga sem sal em temperatura ambiente
- 200 ml de leite gelado
- 2 ovos grandes
Recheio:
- 200 gr de coco seco ralado
- 150 gr de açúcar cristal
- 50 gr de manteiga
A massa pode ser sovada na mão ou na batedeira planetária com o batedor tipo “gancho”.
Na tigela da batedeira, adicione toda a farinha, o sal, o fermento e o açúcar e misture. Em seguida, adicionar o leite gelado e os ovos. Deixe os ingredientes se misturarem por cerca de 15 minutos, sempre limpando as laterais da tigela quando necessário.
Quando a massa estiver mais lida adicione a manteiga em ponto de pomada e deixe bater até toda a manteiga ser incorporada.
Caso esteja sovando na mão, é só adicionar os ingredientes numa tigela e misturar manualmente. Assim que a massa se tornar homogênea, transfira para uma bancada resistente e sove até conseguir os pontos indicados anteriormente.
Assim que terminar essa etapa, cubra a tigela com um filme PVC ou um pano úmido e deixe a massa fermentar por 1 hora ou até dobrar de tamanho.
Dica do padeiro: O tempo de fermentação pode variar com a temperatura do dia ou até mesmo do ambiente em que a tigela estiver. Como a fermentação é um dos elementos mais importantes de fazer pão e é onde muitas pessoas acabam errando nesse tipo de receita, escolha um local fresco para que você consiga acompanhar direitinho esse processo. Tempo e paciência são a alma do negócio.
Após a primeira fermentação, abra a massa com um rolo, em um formato retangular com cerca de 70cm de largura por 45cm de altura. Espalhe a manteiga por toda a massa, polvilhe o açúcar e o coco. Enrole a massa na horizontal, como um rocambole.
Você pode finalizar de dois modos:
1. Fatia a massa enrolada em dois. Com cada metade, você fatia ao comprido e faz uma trança e junta as pontas. Coloque em duas assadeiras de bolo com furo no meio.
2. Divida a massa em 14 fatias e arrume as roscas em duas assadeiras redonda de 20cm.
Não precisa untar. Cubra novamente com filme PVC ou pano úmido e deixe crescer por aproximadamente 1 hora ou até dobrar de tamanho.
Pré-aqueça o forno e coloque a prateleira no nível intermediário. Leve ao forno pré-aquecido e asse a 180° C por cerca de 15 minutos ou até ficarem levemente dourados.
Calda:
- 200 ml de leite
- 70 gr de açúcar
- ½ c.c. de extrato natural de baunilha
Enquanto a massa assa, faça a calda. Misture o leite e o açúcar, aqueça até dissolver todo o açúcar. Coloque o extrato natural de baunilha e reserve.
Quando chegar no ponto desejado, retire do forno e regue os pães com a calda de leite com açúcar. Retorne as assadeiras ao forno por mais 10 minutos ou até ficar bem dourados.
Retire do forno e deixe esfriar um pouco, mas desenforme ainda mornos para facilitar soltar da forma.
Com informações de Isabel Oliveira.
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