"Publicado recentemente o último levantamento sobre violência contra mulheres no país, encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública ao instituto Datafolha. A pesquisa trouxe dados impressionantes: uma em cada quatro mulheres acima de 16 anos afirma ter sofrido algum tipo de violência no último ano. Cerca de 17 milhões de mulheres, portanto.
Os números dão uma dimensão do problema e dos desafios no campo das políticas integradas de Assistência, Saúde e Segurança Pública. Por trás dos números, estão as histórias de vidas concretas e relatos de violências físicas, sexuais, morais, psicológicas e patrimoniais.
Historicamente, as hierarquias construídas com base no gênero tem gerado e mantido violências que se expressam não apenas no feminicídio e na violência física - expressão mais visível do problema - mas também na parte submersa deste gigantesco iceberg das produções de subalternidades: divisão social do trabalho, desigualdade de renda, baixa representação nas instâncias de decisão, trabalhos não remunerados, educação sexista, humor machista e objetificação do corpo feminino, para citar apenas algumas de suas manifestações.
No campo do Direito, vale destacar que o próprio olhar lançado pelo sistema jurídico encontra-se mediado por representações e convenções do feminino e do masculino que pressupõe padrões de comportamento dados como “normais" para homens e mulheres. Assim, autoras da Criminologia Feminista tem destacado, para citar apenas um exemplo, que há um predomínio, dentro do sistema penal, de uma representação da mulher por seu suposto papel e função sexual como reprodutora. Desse modo, o que se protege em um crime de estupro não é a liberdade sexual feminina, mas como isso afeta a unidade familiar, existindo com frequência uma vitimização secundária, operada pelas próprias instâncias estatais, na qual se avalia a violência sofrida pelas condutas das mulheres e o quanto elas teriam “contribuído" com a violência, por exemplo, ao usar determinadas roupas ou ao ingerir substâncias psicoativas.
Em que pese mudanças recentes na legislação, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, tal realidade ainda precisa ser encarada na esteira das mudanças da própria cultura institucional e política que hierarquiza mulheres, considerando inclusive outros eixos associados de exploração e discriminação (raça, orientação sexual, religião etc.).
Existem especificidades relevantes na violência de gênero, estudadas tanto no campo da Vitimilogia quanto nas intervenções do que se tem convencionado chamar de Psicologia Social Jurídica: a) os principais agressores são pessoas do convívio da mulher: companheiros, namorados, ex-parceiros, pais, irmãos, filhos e vizinhos; b) a casa tem sido o ambiente mais perigoso para as mulheres, concentrando 48,8% das agressões; e c) existe uma incidência muito maior de agressões que exigem proximidade, com redução do uso de armas de fogo (quando comparadas com a violência cometida contra homens) e concomitante aumento de estrangulamento/sufocação, espancamentos e uso de objetos perfuro-cortantes ou contundentes. Estudos nesse campo podem tanto auxiliar na compreensão da violência de gênero como nas intervenções e políticas preventivas, protetivas e de responsabilização em diferentes níveis e com diferentes sujeitos, incluindo o próprio agressor.
Diante desta realidade complexa, a Psicologia pode e deve atuar considerando a conjuntura na qual essa violência ocorre e o significado que ela assume para cada mulher, potencializando a crítica social sobre representações sexistas, promovendo alternativas que enfrentem o discurso dominante das relações de poder e oferecendo atendimentos individuais e em grupo em articulação com a rede de proteção institucional.
Numa sociedade que ainda julga a mulher em contexto de violência, colocando sobre ela a necessidade de ter “coragem” para denunciar (e, portanto, sem considerar as várias vicissitudes das relações de poder aí envolvidas), a Psicologia pode intervir tanto no sentido de auxiliar as mulheres em contextos de violência como na construção de políticas que enfrentem de forma mais estrutural a violência de gênero.
Os números dão uma dimensão do problema e dos desafios no campo das políticas integradas de Assistência, Saúde e Segurança Pública. Por trás dos números, estão as histórias de vidas concretas e relatos de violências físicas, sexuais, morais, psicológicas e patrimoniais.
Historicamente, as hierarquias construídas com base no gênero tem gerado e mantido violências que se expressam não apenas no feminicídio e na violência física - expressão mais visível do problema - mas também na parte submersa deste gigantesco iceberg das produções de subalternidades: divisão social do trabalho, desigualdade de renda, baixa representação nas instâncias de decisão, trabalhos não remunerados, educação sexista, humor machista e objetificação do corpo feminino, para citar apenas algumas de suas manifestações.
No campo do Direito, vale destacar que o próprio olhar lançado pelo sistema jurídico encontra-se mediado por representações e convenções do feminino e do masculino que pressupõe padrões de comportamento dados como “normais" para homens e mulheres. Assim, autoras da Criminologia Feminista tem destacado, para citar apenas um exemplo, que há um predomínio, dentro do sistema penal, de uma representação da mulher por seu suposto papel e função sexual como reprodutora. Desse modo, o que se protege em um crime de estupro não é a liberdade sexual feminina, mas como isso afeta a unidade familiar, existindo com frequência uma vitimização secundária, operada pelas próprias instâncias estatais, na qual se avalia a violência sofrida pelas condutas das mulheres e o quanto elas teriam “contribuído" com a violência, por exemplo, ao usar determinadas roupas ou ao ingerir substâncias psicoativas.
Em que pese mudanças recentes na legislação, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, tal realidade ainda precisa ser encarada na esteira das mudanças da própria cultura institucional e política que hierarquiza mulheres, considerando inclusive outros eixos associados de exploração e discriminação (raça, orientação sexual, religião etc.).
Existem especificidades relevantes na violência de gênero, estudadas tanto no campo da Vitimilogia quanto nas intervenções do que se tem convencionado chamar de Psicologia Social Jurídica: a) os principais agressores são pessoas do convívio da mulher: companheiros, namorados, ex-parceiros, pais, irmãos, filhos e vizinhos; b) a casa tem sido o ambiente mais perigoso para as mulheres, concentrando 48,8% das agressões; e c) existe uma incidência muito maior de agressões que exigem proximidade, com redução do uso de armas de fogo (quando comparadas com a violência cometida contra homens) e concomitante aumento de estrangulamento/sufocação, espancamentos e uso de objetos perfuro-cortantes ou contundentes. Estudos nesse campo podem tanto auxiliar na compreensão da violência de gênero como nas intervenções e políticas preventivas, protetivas e de responsabilização em diferentes níveis e com diferentes sujeitos, incluindo o próprio agressor.
Diante desta realidade complexa, a Psicologia pode e deve atuar considerando a conjuntura na qual essa violência ocorre e o significado que ela assume para cada mulher, potencializando a crítica social sobre representações sexistas, promovendo alternativas que enfrentem o discurso dominante das relações de poder e oferecendo atendimentos individuais e em grupo em articulação com a rede de proteção institucional.
Numa sociedade que ainda julga a mulher em contexto de violência, colocando sobre ela a necessidade de ter “coragem” para denunciar (e, portanto, sem considerar as várias vicissitudes das relações de poder aí envolvidas), a Psicologia pode intervir tanto no sentido de auxiliar as mulheres em contextos de violência como na construção de políticas que enfrentem de forma mais estrutural a violência de gênero.
Professora doutora Ana Vládia Holanda Cruz-docente do Curso de Psicologia do Centro Universitário Ateneu.
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