O amor que deveria sarar, mas provocou feridas maiores. E.M.S, 53, estilista e arquiteta, encontrava-se numa situação de profunda dor após terminar um relacionamento de nove anos após uma tragédia que deixou o noivo tetraplégico. Vulnerável emocionalmente, ela se viu envolvida pela amizade de um estrangeiro, que conheceu em 2012. Mostrando-se amoroso e bastante apaixonado, ele veio ao Brasil visitá-la e iniciaram o namoro. “Parecia a companhia perfeita para que eu saísse daquela situação emocional”, relata.
Passado pouco mais de um ano de relacionamento, o namorado começou a manifestar seu interesse em morar no Brasil para se casar com ela e ajudá-la em seus negócios. Casados em 2014, passaram a viver juntos em Fortaleza e, a partir daí, as coisas mudaram. Ela conta que o marido mudou de atitude logo que se tornou sócio de suas empresas, passando a controlar seus bens e sua liberdade, afastando-lhe dos amigos, família e colocando-a sob uma circunstância de cárcere privado.
Ela era mais uma vítima de violência patrimonial e estelionato afetivo. “Ele tinha posse de tudo que eu tinha. Ele fez empréstimos bancários, fazia contas e pegava meus documentos, me levava e me obrigava a assinar, quando era necessário minha assinatura. Enfim, ele manipulou as coisas de modo a tomar tudo o que eu tinha. Ele fez uso do que eu tinha, trocando por investimentos que ele fazia em bancos, pegou dinheiro em troca dos objetos… Foi tudo usado por ele para se apoderar dos valores financeiros”, explana.
O estelionato afetivo se configura a partir de relações de caráter emocional e amoroso, cuja definição tem origem no artigo 171 do Código Penal, que define o estelionato propriamente dito: uma das partes tem a intenção de “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício, ardil ou qualquer meio fraudulento”.
A defensora pública da 1ª Defensoria do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher da Defensoria (NUDEM), Ana Kelly detalha que “o estelionato afetivo tem características bem peculiares”. É considerado como crime pelo Código de Processo Penal, mas está envolvido dentro de uma relação de afeto, uma relação de confiança, onde a vítima (na maioria das vezes, uma mulher) consente porque está sofrendo uma violência patrimonial e psicológica. A mulher está totalmente dominada, manipulada por aquele agressor. E, por conta dessa manipulação, ela confia cegamente naquele agressor ou está acuada para responder, o que acaba, na prática, em comprometimentos que estão além da sua capacidade financeira para satisfazer o outro”, explica a defensora.
Ana Kelly pontua que é uma situação muito difícil para mulher que está inserida neste ciclo de violência psicológica e patrimonial, se perceber como vítima, o que só acontece muitas vezes quando o relacionamento se finda ou então quando ela já está com muitas dívidas. “Muitas vezes a mulher mesmo se reconhecendo como vítima, tem uma dificuldade muito grande de ir buscar ajuda, de pedir socorro, porque ela tem vergonha de ter se permitido estar naquela condição. Nenhuma mulher precisa ter vergonha, ela tem que buscar ajuda e estamos aqui para isso”, sublinha.
Foi isto que E. fez. Após alguns meses na situação de cárcere privado, ela conseguiu se libertar e pedir ajuda. Sofrendo de um grave trauma psicológico e emocional, passou um tempo com sua família, em Recife, enquanto o companheiro continuava seus negócios sem qualquer tipo de empecilho. “Até conseguir me libertar disso foi preciso muito tempo e muito tratamento. Esta situação ainda mexe muito comigo. Depois de um ano que eu fugi de casa, consegui dar entrada nos processos para reaver meus bens, obter o divórcio… Eu tinha medo dele, fiquei sem nada, sem dinheiro, sem emprego, sem o contato com as pessoas que eu conhecia. Tinha vergonha das pessoas, tudo foi muito difícil”, expõe.
Ela explica que moveu seis processos jurídicos contra o ex-companheiro, viabilizados depois de receber orientação no Nudem da Defensoria Pública. Até o momento, ela teve êxito apenas no processo de divórcio, mas requereu na Justiça uma ação por danos morais, queixas por crime de violência doméstica e um processo para dissolução da sociedade, entre outros. Com dívidas acumuladas no seu nome, ela ainda luta, só que na justiça, para reaver bens, dignidade e responsabilizar o ex-marido.
Supervisora do NUDEM, a defensora pública Jeritza Lopes ressalta o papel da Defensoria no momento em que a vítima precisa ingressar com ações judiciais cabíveis para tentar conseguir reaver sua vida e salienta que é necessário que se traga provas do crime de estelionato cometido pelo companheiro. “São muito importantes as provas, seja por aplicativo de mensagens, de voz e também até das pessoas próximas que reconhecem essa situação. Essa é uma das violências mais complexas, primeiro porque elas não têm consciência de que são capazes de ingressar na justiça com uma ação de danos materiais e danos morais. As vítimas não têm esse conhecimento e quando elas nos procuram, elas não têm nenhum meio de prova, a não ser a palavra dela”, alerta Jeritza.
Segundo a defensora, este crime ainda pode ser cometido por outras relações de afeto que não só o marido/companheiro. Filhos com mães, afilhados com tias, netos com avós também podem usar a relação afetiva para extorquir e usar o nome da pessoa indevidamente, usando chantagem para fazer empréstimos. Dentro do processo, a defensora explica que a princípio é necessário que se verifique se a dívida foi feita em benefício de ambos ou em benefício próprio. Como se trata de uma teoria nova, quem tem entendimentos diversos no judiciário, todas as provas são importantes.
O caminho é buscar a Defensoria munida de todas as provas possíveis para que alcance êxito nesta ação. “Nós vamos realizar o atendimento, entender a situação, orientar e acolhê-la. É importante este passo rumo a libertação deste tipo de violência porque ela dilacera não só o emocional, como toda a vida da pessoa profissional e financeira. Além da documentação pessoal dela, fotos, comprovantes desta relação, testemunhas, mensagens de texto, tudo é válido para tentar provar a situação da violência a que ela estava submetida”, explica.
Passado pouco mais de um ano de relacionamento, o namorado começou a manifestar seu interesse em morar no Brasil para se casar com ela e ajudá-la em seus negócios. Casados em 2014, passaram a viver juntos em Fortaleza e, a partir daí, as coisas mudaram. Ela conta que o marido mudou de atitude logo que se tornou sócio de suas empresas, passando a controlar seus bens e sua liberdade, afastando-lhe dos amigos, família e colocando-a sob uma circunstância de cárcere privado.
Ela era mais uma vítima de violência patrimonial e estelionato afetivo. “Ele tinha posse de tudo que eu tinha. Ele fez empréstimos bancários, fazia contas e pegava meus documentos, me levava e me obrigava a assinar, quando era necessário minha assinatura. Enfim, ele manipulou as coisas de modo a tomar tudo o que eu tinha. Ele fez uso do que eu tinha, trocando por investimentos que ele fazia em bancos, pegou dinheiro em troca dos objetos… Foi tudo usado por ele para se apoderar dos valores financeiros”, explana.
O estelionato afetivo se configura a partir de relações de caráter emocional e amoroso, cuja definição tem origem no artigo 171 do Código Penal, que define o estelionato propriamente dito: uma das partes tem a intenção de “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício, ardil ou qualquer meio fraudulento”.
A defensora pública da 1ª Defensoria do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher da Defensoria (NUDEM), Ana Kelly detalha que “o estelionato afetivo tem características bem peculiares”. É considerado como crime pelo Código de Processo Penal, mas está envolvido dentro de uma relação de afeto, uma relação de confiança, onde a vítima (na maioria das vezes, uma mulher) consente porque está sofrendo uma violência patrimonial e psicológica. A mulher está totalmente dominada, manipulada por aquele agressor. E, por conta dessa manipulação, ela confia cegamente naquele agressor ou está acuada para responder, o que acaba, na prática, em comprometimentos que estão além da sua capacidade financeira para satisfazer o outro”, explica a defensora.
Ana Kelly pontua que é uma situação muito difícil para mulher que está inserida neste ciclo de violência psicológica e patrimonial, se perceber como vítima, o que só acontece muitas vezes quando o relacionamento se finda ou então quando ela já está com muitas dívidas. “Muitas vezes a mulher mesmo se reconhecendo como vítima, tem uma dificuldade muito grande de ir buscar ajuda, de pedir socorro, porque ela tem vergonha de ter se permitido estar naquela condição. Nenhuma mulher precisa ter vergonha, ela tem que buscar ajuda e estamos aqui para isso”, sublinha.
Foi isto que E. fez. Após alguns meses na situação de cárcere privado, ela conseguiu se libertar e pedir ajuda. Sofrendo de um grave trauma psicológico e emocional, passou um tempo com sua família, em Recife, enquanto o companheiro continuava seus negócios sem qualquer tipo de empecilho. “Até conseguir me libertar disso foi preciso muito tempo e muito tratamento. Esta situação ainda mexe muito comigo. Depois de um ano que eu fugi de casa, consegui dar entrada nos processos para reaver meus bens, obter o divórcio… Eu tinha medo dele, fiquei sem nada, sem dinheiro, sem emprego, sem o contato com as pessoas que eu conhecia. Tinha vergonha das pessoas, tudo foi muito difícil”, expõe.
Ela explica que moveu seis processos jurídicos contra o ex-companheiro, viabilizados depois de receber orientação no Nudem da Defensoria Pública. Até o momento, ela teve êxito apenas no processo de divórcio, mas requereu na Justiça uma ação por danos morais, queixas por crime de violência doméstica e um processo para dissolução da sociedade, entre outros. Com dívidas acumuladas no seu nome, ela ainda luta, só que na justiça, para reaver bens, dignidade e responsabilizar o ex-marido.
Supervisora do NUDEM, a defensora pública Jeritza Lopes ressalta o papel da Defensoria no momento em que a vítima precisa ingressar com ações judiciais cabíveis para tentar conseguir reaver sua vida e salienta que é necessário que se traga provas do crime de estelionato cometido pelo companheiro. “São muito importantes as provas, seja por aplicativo de mensagens, de voz e também até das pessoas próximas que reconhecem essa situação. Essa é uma das violências mais complexas, primeiro porque elas não têm consciência de que são capazes de ingressar na justiça com uma ação de danos materiais e danos morais. As vítimas não têm esse conhecimento e quando elas nos procuram, elas não têm nenhum meio de prova, a não ser a palavra dela”, alerta Jeritza.
Segundo a defensora, este crime ainda pode ser cometido por outras relações de afeto que não só o marido/companheiro. Filhos com mães, afilhados com tias, netos com avós também podem usar a relação afetiva para extorquir e usar o nome da pessoa indevidamente, usando chantagem para fazer empréstimos. Dentro do processo, a defensora explica que a princípio é necessário que se verifique se a dívida foi feita em benefício de ambos ou em benefício próprio. Como se trata de uma teoria nova, quem tem entendimentos diversos no judiciário, todas as provas são importantes.
O caminho é buscar a Defensoria munida de todas as provas possíveis para que alcance êxito nesta ação. “Nós vamos realizar o atendimento, entender a situação, orientar e acolhê-la. É importante este passo rumo a libertação deste tipo de violência porque ela dilacera não só o emocional, como toda a vida da pessoa profissional e financeira. Além da documentação pessoal dela, fotos, comprovantes desta relação, testemunhas, mensagens de texto, tudo é válido para tentar provar a situação da violência a que ela estava submetida”, explica.
O Nudem defende os direitos das mulheres contra todo tipo de violência, assegurando sua integridade no âmbito físico, moral e psicológico através da assistência jurídica gratuita e equânime.
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