Confira a crônica de Marlyana Lima: 'O que a memória ama fica eterno', publicada no Diário do Nordeste:
- Tinha 14 anos quando subi, pela primeira vez, as escadarias do velho Liceu do Ceará. Para uma adolescente nascida e criada na periferia da cidade, estudar no maior colégio público do Estado era uma conquista e tanto. Aos meus olhos de menina, tudo era grandioso, carregado de simbolismo, de história.
Era estudiosa confesso, curiosa também. Sempre quis saber mais sobre aquele lugar que parecia nos descolar dos tempos modernos e nos levar a épocas imperiais. A arquitetura era incomum, as salas de aula amplas e recortadas por janelas gigantescas, o pátio imponente e a Biblioteca parecia conter todos as obras literárias que eu sempre sonhei ler.
Nas paredes, placas antigas imortalizavam nomes de ex-alunos que hoje figuram nos livros como personalidades de destaque nas diversas áreas do saber e da vida política-social do Estado.
Sem saber, a menina de periferia teve a chance (e honra) de estudar onde nomes como Clóvis Beviláqua, Bezerra de Menezes, Raimundo Cela, Parsifal Barroso, Rodolfo Teófilo e tantos outros cearenses ilustres tinham aprendido suas lições de álgebra, gramática, física...
Olhando pelas lentes da memória, vejo que aquela sensação de pertencimento acabou forjando o meu respeito pelo patrimônio histórico da cidade. Afinal, a caminho do Liceu, pelas ruas do bairro Jacarecanga e do Centro, era impossível não perceber um pouco da Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção dos tempos provinciais. Os casarões, os palacetes, as praças e até a Estação João Felipe, onde eu pegava o trem, ainda refletiam seus tempos gloriosos.
Curiosamente, não me lembro de ter lido uma página sequer sobre a história da Capital ou do Ceará quando cursei o ensino médio. Estudei no terceiro colégio mais antigo do Brasil, criado como instituição-modelo há 175 anos, mas só tive essa consciência quando já era adulta. Mas, como diria Adélia Prado, "o que a memória ama, fica eterno".
Desde então, saudosismos à parte, vi a cidade mudar. Os casarões foram aos poucos dando espaço a edifícios e condomínios. Os palacetes, corroídos pelo tempo, desapareceram em meio à paisagem, urbana demais para dar espaço a bens tombados.
As praças - da Estação, da Lagoinha e a Gustavo Barroso -, antes espaços de convivência e lazer, se viram tomadas pelo comércio desordenado e pelo lixo. Acabaram relegadas ao abandono. Os registros de toda uma época tornavam-se, ano após ano, invisíveis.
Com o tempo, também mudei e me dei conta de que sou filha de uma cidade bela e jovem, dourada de sol e que sonha com o futuro, mas não respeita sua identidade, e nem demonstra ter orgulho de seu próprio passado".
Era estudiosa confesso, curiosa também. Sempre quis saber mais sobre aquele lugar que parecia nos descolar dos tempos modernos e nos levar a épocas imperiais. A arquitetura era incomum, as salas de aula amplas e recortadas por janelas gigantescas, o pátio imponente e a Biblioteca parecia conter todos as obras literárias que eu sempre sonhei ler.
Nas paredes, placas antigas imortalizavam nomes de ex-alunos que hoje figuram nos livros como personalidades de destaque nas diversas áreas do saber e da vida política-social do Estado.
Sem saber, a menina de periferia teve a chance (e honra) de estudar onde nomes como Clóvis Beviláqua, Bezerra de Menezes, Raimundo Cela, Parsifal Barroso, Rodolfo Teófilo e tantos outros cearenses ilustres tinham aprendido suas lições de álgebra, gramática, física...
Olhando pelas lentes da memória, vejo que aquela sensação de pertencimento acabou forjando o meu respeito pelo patrimônio histórico da cidade. Afinal, a caminho do Liceu, pelas ruas do bairro Jacarecanga e do Centro, era impossível não perceber um pouco da Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção dos tempos provinciais. Os casarões, os palacetes, as praças e até a Estação João Felipe, onde eu pegava o trem, ainda refletiam seus tempos gloriosos.
Curiosamente, não me lembro de ter lido uma página sequer sobre a história da Capital ou do Ceará quando cursei o ensino médio. Estudei no terceiro colégio mais antigo do Brasil, criado como instituição-modelo há 175 anos, mas só tive essa consciência quando já era adulta. Mas, como diria Adélia Prado, "o que a memória ama, fica eterno".
Desde então, saudosismos à parte, vi a cidade mudar. Os casarões foram aos poucos dando espaço a edifícios e condomínios. Os palacetes, corroídos pelo tempo, desapareceram em meio à paisagem, urbana demais para dar espaço a bens tombados.
As praças - da Estação, da Lagoinha e a Gustavo Barroso -, antes espaços de convivência e lazer, se viram tomadas pelo comércio desordenado e pelo lixo. Acabaram relegadas ao abandono. Os registros de toda uma época tornavam-se, ano após ano, invisíveis.
Com o tempo, também mudei e me dei conta de que sou filha de uma cidade bela e jovem, dourada de sol e que sonha com o futuro, mas não respeita sua identidade, e nem demonstra ter orgulho de seu próprio passado".
Comentários
Postar um comentário