O manancial de água cearense é criteriosamente monitorado (foto Cogerh) |
Os seis anos (2012-2013-2014-2015-2016-2017) consecutivos de seca no Ceará não racharam somente o solo. O coração-sertanejo dos cearenses também cindiu ('cortou') com a escassez das chuvas. E, não distante, de vida. No entanto, ainda que a pouca disponibilidade de água tenha afetado todos os setores da economia cearense, o setor de recursos hídricos no Ceará tem empreendido esforços no sentido de garantir os múltiplos usos da água disponível, com foco no abastecimento humano, mas sem deixar de lado o desenvolvimento econômico do estado.
Para isso, foi preciso ressignificar sua gestão - não só como garantia para o consumo humano, mas como motor econômico direto e indireto para manutenção de diversos postos de trabalho.
De acordo com informações da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará (Cogerh), 75% da água armazenada nos reservatórios cearenses em 2017 foram direcionados ao abastecimento humano. Já o volume fornecido para a irrigação (16%) e para a indústria (7%) figuraram o segundo e o terceiro lugares na distribuição do recurso, respectivamente.
Neste contexto, as políticas públicas implantadas pelo Governo do Ceará para a convivência com a seca, aliadas à capacidade de resiliência dos cearenses, tem colaborado para ultrapassar a longa estiagem. É o caso do agricultor Francisco Castro, de 26 anos. A plantação de milho que ele e o pai, Osaías Castro, de 64 anos, tomavam de conta, no interior de Quixeramobim, no Sertão Central do Ceará, demandava muita água — o que é impraticável em tempos de aridez. Foi preciso repensar novas práticas de irrigação para manter não só o sustento da família, como a fé na vida no campo. “Mesmo com a seca, daqui eu não saio. Já viu trocar uma paisagem dessas pela cidade? Nenhum homem no mundo pode ser mais feliz do que num lugar como este”, reconhece o pai, apontando para o horizonte verde que ele entende como lar.
O verdor não é só pela chuva da madrugada anterior ao dia da entrevista, que alegrou a vegetação, mas também pelo novo cultivo. Para substituir o milho, Francisco e Osaías optaram pela lavra de palma-forrageira, planta de vida perene, que resiste bem à infertilidade do solo. Além do uso forrageiro, a palma também se presta à alimentação humana e à jardinagem. Para sustentar a cultura, os agricultores apostaram na irrigação por gotejamento, que aplica água de forma pontual, por meio de gotas, no solo. Além disso, eles reutilizam água da lavagem da louça para banhar as terras.
O lucro do novo negócio vem da venda de palmas para outros agricultores e para o Hora de Plantar, programa do Governo do Ceará que distribui sementes e mudas a cultivadores do estado, objetivando o aumento de renda e a garantia de segurança alimentar aos cearenses. “Nove pessoas são empregadas com essa plantação. Apesar da pouca água, a gente vai se ajustando. O importante é que não falte. E você vê a distribuição de renda, e fica feliz, minimamente, quando um funcionário seu compra uma motinha”, emociona-se Francisco, abraçando o pai como quem demonstra gratidão pelas memórias naquele chão de terra batida.
O método adotado pelos agricultores para manter a colheita é o indicado pelo governador Camilo Santana, que defende a boa gestão da água para não haver racionamento. “Nós proibimos culturas temporárias, como a de arroz, que exige muita água. Estimulamos sistemas localizados, de gotejamento, proibindo a irrigação por aspersão. O que nós temos procurado fazer com o destino dessa água é priorizar o abastecimento humano. Porém, não podemos causar um prejuízo grande para a economia, não fornecendo água para nossos setores produtivos”, avalia.
Sabido que o setor industrial é uma das componentes que recebem a menor parcela de água armazenada do estado, o enfrentamento à seca pelo segmento torna-se ainda mais desafiador. A empresa de bebidas Ypióca, por exemplo, teve de reduzir sua produção. A destilaria gera, hoje,um terço do que era produzido há cinco anos, quando o que seria o longevo período de estiagem bateu à porta.
A usina, que tem sede no município cearense de Paraipaba, na microrregião do Baixo Curu, implantou torres de refrigeração, que substituíram o sistema aberto de resfriamento, onde se tinha o maior consumo de água da operação, e eliminou a etapa de lavagem da cana, na qual se tinha o segundo maior processo com consumo de água. Dentre outras medidas, foram realizadas, também, campanhas internas de conscientização com foco no combate a vazamentos e desperdícios.
O complexo não utiliza água da comunidade, pois tem lagoa própria — que, apesar da pouca quantidade de água, teve seu uso potencializado com as alternativas. Segundo a diretora de Relações Corporativas e Jurídico da Diageo — empresa detentora da marca Ypióca —, Nelcina Tropardi, houve uma redução do consumo de água na ordem de 90% nas operações do complexo, se comparado com o dispêndio de 2014.
“Nossa indústria, além de atuar diretamente neste equilíbrio, gera empregos e renda nas regiões em que atuamos. Esse equilíbrio é fundamental para a manutenção da oferta de água para todos. Nosso consumo se dá de forma responsável, não só devido à crise hídrica que acomete o Ceará há alguns anos, mas pela consciência de sermos protagonistas nessa jornada pela sustentabilidade em nossas operações”, reconhece a gestora.
A maior seca dos últimos tempos no Ceará também impactou o agronegócio. Para o empresário e presidente da Associação dos Produtores de Flores do Ceará (Floresce), Gilson Gondim, a desventura poderia ser maior caso a oferta hídrica para os negócios fosse nula. Apesar de o consumo ter diminuído, o volume de água concedido ainda dá fôlego para o comércio — apesar de alguns produtores terem mudado de ramo ou terem migrado para regiões menos insalubres.
“As pessoas têm a visão que a (distribuição de) água para o agronegócio é para enriquecer o produtor rural . O emprego qualificado no interior (do Ceará) é do agronegócio e da indústria. Se não tiver água, não tem emprego. Se não tiver emprego, o prejuízo é multiplicado”, defende o empresário.
Gondim também atenta para as estratégias que o Governo do Ceará tem feito para assegurar a água necessária para os cultivos possíveis. “Existem, hoje, 200 produtores de plantas ornamentais. Quatro ou cinco são grandes empresas; o restante diz respeito aos pequenos negócios. Aqui, no Ceará, 15 mil empregos são gerados somente nesse ramo. E não é só o cultivo, tem o transporte, a comercialização, as cadeias multiplicadores etc. Poderia ser pior”, avalia o presidente da Floresce.
O secretário da Agricultura, Pesca e Aquicultura, Euvaldo Bringel, reconhece as dificuldades enfrentadas pelos produtores diante da crise hídrica no estado. O gestor indica, porém, que haja uma gestão dos recursos harmônica entre os agricultores e o Estado. “É preciso adaptar as produções, encontrar alternativas”, revela.
Texto de Caio Faheina, da Comunicação Social do Governo do Estado do Ceará.
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