"A realização de grandes eventos esportivos mundiais, muito além da conquista de títulos e medalhas, tem o objetivo de contribuir para o aquecimento e fortalecimento da economia do país-sede. Certo? Sim, desde que esse país não se chame Brasil. Evidência de que para nós as competições internacionais previstas no calendário deverão representar grande investimento com baixo retorno social e econômico, se não prejuízo, é o decreto do Governo Federal, publicado no Diário Oficial da União, em 17 de maio, concedendo isenção de tributos nas importações destinadas à Copa das Confederações, este ano, e à Copa do Mundo de 2014.
Locupletam-se da isenção, dentre outros itens, os alimentos, suprimentos médicos, combustível, materiais de escritório e, pasmem, até troféus. O benefício inclui o Imposto sobre Produtos Industrializados incidente na importação, Imposto de Importação, PIS/Pasep-Importação, Cofins-Importação, Taxa de utilização do Siscomex, Taxa de utilização do Mercante, Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante e Cide-combustíveis.
É constrangedor constatar que os produtos listados nessa benevolente medida pertencem a setores nos quais a produção nacional é reconhecidamente eficaz, tanto em qualidade, quanto na capacidade de atendimento à demanda. Ou alguém duvida que o Brasil seja um dos líderes mundiais da agropecuária, tenha parque gráfico com reconhecida expertise e excelência para imprimir artigos de papelaria para escritórios e quaisquer outros usos, elevada produção de combustíveis, inclusive etanol, e indústria farmacêutica apta a suprir o mercado? Ah, sim, os troféus! Para quem não sabe, o design é um dos segmentos nos quais nosso país mais avançou nos últimos anos, e matérias-primas não nos faltam, sejam as peças cunhadas em ferro, aço, cobre, alumínio, ouro, pedras preciosas ou qualquer outro material burilado na mente criativa de quem deseja importá-los...
Mais grave ainda é que há setores produtivos nacionais — inclusive alguns, como o gráfico, que terão desvantagem com a isenção fiscal dada aos seus concorrentes externos no fornecimento às copas da Confederação e do Mundo — solicitando há bom tempo ao governo algumas medidas voltadas ao resgate de sua competitividade. No caso da indústria gráfica, que fechou o primeiro trimestre com déficit de US$ 62,13 milhões em sua balança comercial (aumento de 6,7% em relação a igual período de 2012), temos pleiteado, em vão, a desoneração da folha de pagamentos, isenção de impostos para os materiais escolares, alíquota zero do PIS/Cofins para a atividade de impressão de livros e a retirada de seis papeis de imprimir da lista de cem produtos que tiveram suas alíquotas de importação elevadas pela Camex.
Para os segmentos que nitidamente estão perdendo a capacidade de concorrer com empresas de outras nações nas quais há menos impostos e burocracia, juros menores, logística mais barata e câmbio mais favorável, essa isenção tributária para importados, por ocasião dos eventos esportivos, causa profunda indignação. Cabe perguntar o porquê, então, de não se ter calculado o valor da perda fiscal correspondente à isenção concedida aos importados, de modo que, em vez disso, fossem contemplados produtos nacionais com a correspondente redução do IPI? Ademais, antes da adoção de medida tão surpreendente, seria no mínimo ético ter consultado as lideranças dos setores abrangidos para lhes arguir quanto à capacidade de atendimento à demanda relativa às competições.
Estamos desperdiçando grande oportunidade de revitalizar alguns segmentos com grande potencial de atender ao consumo de bens e serviços inerentes às competições da Fifa e à demanda expressiva que geram. Preferiu-se estimular empresas estrangeiras. Assim, começamos perdendo a Copa das Confederações e a do Mundo. E, o que é pior, jogando em casa e com gols contra.
*Fabio Arruda Mortara, M.A., MSc., empresário, é presidente da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf Nacional) e do Sindicato das Indústrias Gráficas do Estado de São Paulo (Sindigraf-SP).
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