EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OPERAÇÃO DE EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. RECURSOS DO FUNDO CONSTITUCIONAL DE FINANCIAMENTO DO NORDESTE - FNE. INÉPCIA DA INICIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRELIMINAR REJEITADA. REDUÇÃO DE TARIFA BANCÁRIA. PREJUÍZO EXPERIMENTADO PELO BNB. RECONHECIMENTO DA ILEGITIMIDADE DO MPF QUANTO A ESSA QUESTÃO. ATENTADO CONTRA PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ACÓRDÃO DO TCU. NÃO VINCULAÇÃO DA ESFERA JUDICIAL. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO PATRIMONIAL. IRRELEVÂNCIA. VANTAGEM INDEVIDA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.
- Os fatos narrados puderam ser contestados pelos réus, tanto que o fizeram nas defesas apresentadas, não se constatando, portanto, a ocorrência da inépcia alegada. Preliminar rejeitada.
- O Ministério Público Federal possui legitimidade para questionar a regularidade da operação de empréstimo objeto da lide, uma vez que esta envolveu recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, donde patente o interesse federal a ser tutelado por meio da vertente ação civil pública de improbidade administrativa.
- Em relação à redução da tarifa bancária de contratação, o titular do direito patrimonial supostamente violado é o Banco do Nordeste do Brasil - BNB, sociedade de economia mista federal, que não tem foro nesta Justiça Federal. É que, em sendo tal tarifa destinada única e exclusivamente a remunerar o trabalho do citado banco com a análise creditícia do potencial contratante, o prejuízo pela redução indevida será experimentado pela referida pessoa jurídica. Preliminar acolhida.
- O conceito de improbidade, assim denominado pela Carta Magna de 88 o ato lesivo à moralidade administrativa, está intimamente ligado à necessidade de o agente público atuar sempre com honestidade e em atendimento aos interesses públicos, sem aproveitar-se indevidamente dos poderes e das facilidades que lhes são conferidos no exercício de mandato, função, emprego ou cargo público.
- É de ser afastada a alegação no sentido de não ser possível o acolhimento da pretensão formulada nestes autos, tendo em vista o Acórdão nº 2.186/2005 proferido pelo Tribunal de Contas da União - TCU no bojo da TC 012.842/2005-8, que concluiu pela regularidade da operação bancária ora verberada, assim como pela ausência de qualquer prejuízo ao erário com sua ultimação. Exegese do art. 21, II da Lei nº 8.429/92 e art. 5º da CF.
- Não obstante demonstrado pela análise técnica procedida pelo TCU que a operação de empréstimo objeto da lide não causou prejuízo ao erário, do exame do conjunto probatório conclui-se pelo malferimento ao princípio constitucional da impessoalidade.
- A aplicação das sanções previstas na Lei nº 8.429/92 independe de "efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento" (art. 21, I).
- As provas e indícios dormitantes nos autos apontam para a conclusão no sentido de que as modificações nos normativos do BNB ocorreram após a apresentação da carta consulta pelo STN, refletindo a disposição dos agentes públicos em viabilizar a aprovação do financiamento em seu favor com tais alterações.
- Conquanto se possa atribuir a tais condutas o enveredamento de um "esforço institucional do BNB, em ingressar em novas searas comerciais" (na esteira da conclusão do acórdão 2.186-2005-TCU), o fato é que, por mais vantajoso que fosse para a instituição adotar providências aptas a viabilizar a operação, não poderia o Banco ter assim agido visando à aprovação de determinada proposta de financiamento.
- O princípio da impessoalidade, encartado no caput do art. 37 da Constituição Federal de 1988, traduz um dever para a Administração, segundo o qual ela "há de ser impessoal, sem ter em mira este ou aquele indivíduo de forma especial".
- O texto constitucional não traz exceções à observância dos princípios que elenca no art. 37. É dizer, não determina a Carta Magna que a Administração deve obedecer ao princípio da impessoalidade, exceto quando a inobservância trouxer-lhe vantagens, ainda que lícitas.
- Não restou cabalmente demonstrada nos autos a percepção de vantagens indevidas em decorrência da viabilização da operação de crédito envolvendo o BNB e o STN.
- Conclusão em sentido contrário, isto é, para reconhecer o pagamento/recebimento de vantagem indevida, basear-se-ia em mera suposição, o que não é cabível, especialmente se levarmos em consideração a natureza gravosa das sanções impostas pela Lei nº 8.429/92.
- Parcial procedência.
1 - RELATÓRIO
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propõe a presente Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa em face de KENNEDY MOURA RAMOS, ROBERTO SMITH, CLÁUDIO VASCONCELOS FROTA, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES, VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE, JOSÉ NOBRE GUIMARÃES, JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA, RAIMUNDA LÚCIA PESSOA DE LIMA, SISTEMA DE TRANSMISSÃO DO NORDESTE - STN, COMPANHIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA e ENPHASE PROJETOS DE INVESTIMENTO E CONSULTORIA LTDA, com base nos fatos seguintes:
Aos 8 (oito) dias do mês de julho do ano de 2005, ADALBERTO VIEIRA DA SILVA foi flagrado no aeroporto de Congonhas, São Paulo (SP), portando US$ 100,599.00 (cem mil, quinhentos e noventa e nove dólares americanos) e mais R$ 209.000,00 (duzentos e nove mil reais) sem qualquer comprovação de origem (cópia do flagrante às fls. 151/152). Segundo o Ministério Público Federal, esse valor seria parte da retribuição (propina) por vantagens ilegais obtidas pelo STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE, cuja acionista majoritária é a COMPANHIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA, em contrato de financiamento obtido junto ao BNB com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, no valor aproximado de R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais), para implementação da rede de transmissão de energia elétrica, em 500kV, com origem na subestação Teresina II e término na subestação Fortaleza II - Circuito 2 - C2.
Quando do flagrante, JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA tinha anotado no verso do seu bilhete de passagem aérea o seguinte: "Zé de Freitas (tel nº 2161.9937) Av. Brigadeiro F. Lima, nº 3.729". Segundo o Ministério Público Federal, "Zé de Freitas" seria JOSÉ PETRONILHO DE FREITAS, um dos diretores da COMPANHIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA. Já o endereço refere-se a um edifício comercial, o Condomínio Edifício Antônio Alves Ferreira Guedes, onde JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA e JOSÉ PETRONILHO DE FREITAS ter-se-iam encontrado no dia 07.07.2005, das 11:17h às 11:27h. A entrada e a saída de JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA foram registradas pelo sistema de segurança do edifício, como se vê à fl. 13.
Segundo o Ministério Público Federal, JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA era assessor desde o ano de 2001 do então Deputado Estadual JOSÉ NOBRE GUIMARÃES, do Partido dos Trabalhadores no Estado do Ceará. KENNEDY MOURA RAMOS era também filiado ao Partido dos Trabalhadores e teria sido assessor parlamentar de JOSÉ NOBRE GUIMARÃES e tesoureiro do Partido dos Trabalhadores quando este era presidente da legenda no Estado; à época dos fatos, ocupava o cargo de assessor da presidência do Banco do Nordeste do Brasil, ao qual teria sido indicado em virtude de sua relação com o Deputado JOSÉ NOBRE GUIMARÃES.
O Ministério Público Federal aduz que KENNEDY MOURA RAMOS agiu como "advogado" dos interesses do STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE para a conclusão do contrato de financiamento, de modo a obter enriquecimento ilícito para si próprio e para JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA, sendo difícil dissociar a figura de JOSÉ NOBRE GUIMARÃES deste contexto. Como prova imediata de que JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA juntamente com sua esposa, RAIMUNDA LÚCIA PESSOA DE LIMA, teriam sido beneficiados com os valores indevidamente recebidos, o Ministério Público aponta a aquisição de um automóvel Corsa 1.8, zero Km, no valor de R$ 36.700,00 (trinta e seis mil e setecentos reais) em nome desta última, muito embora tenham ambos renda incompatível para tanto.
Os registros das ligações telefônicas efetuadas e recebidas a partir dos telefones titulados por JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA e KENNEDY MOURA RAMOS, cuja quebra de sigilo foi determinada nos autos da ação cautelar preparatória a esta ação de improbidade, demonstram que entre os dias 07.07.2005 e 08.07.2005 foram efetuados diversos contatos entre JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA, KENNEDY MOURA RAMOS, JOSÉ NOBRE GUIMARÃES e a ALUSA.
Segundo o Ministério Público Federal, o contrato de financiamento firmado entre STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE e o BANCO DO NORDESTE DO BRASIL, no valor de R$ 299.995.032,33 (duzentos e noventa e nove milhões, novecentos e noventa e cinco mil, trinta e dois reais e trinta e três centavos), não observou as regras estabelecidas pela instituição à época da apresentação da proposta por aquela empresa, ora demandada. Teria sido necessário o desenho de uma nova modalidade de financiamento, chamada "operação estruturada", com base em critérios subjetivos e fluídos, para amoldar as normas do BNB às condições específicas da operação, de molde a permitir que esta pudesse ocorrer. Com base no relatório preliminar de inspeção da Secretaria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União no Estado do Ceará - SECEX/CE, o Ministério Público aponta as seguintes irregularidades na operação:
a) comprometimento do patrimônio líquido do Banco em percentual acima dos 5% (cinco por cento) regularmente admitidos;
b) alteração da programação do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, a fim de possibilitar a operação, mediante a exclusão da cláusula que limitava a participação dos recursos do FNE a 10% do financiamento;
c) financiamento de valor superior aos usuais 70% (setenta por cento) do valor total do projeto;
d) flexibilização das exigências de crédito;
e) não constituição da provisão para devedores duvidosos no montante de R$ 4.499.925,48 (quatro milhões, quatrocentos e noventa e nove mil, novecentos e vinte e cinco reais e quarenta e oito centavos), tanto na contabilidade do Banco quando na do FNE, nos termos do art. 1.º c/c o art. 6º, da Resolução Bacen 2682/1999;
f) redução de modo irregular da tarifa de estudo e contratação de 1,5% (um e meio por cento) para 1% (um por cento) do valor da operação, representando decréscimo de R$ 1.499.900,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e nove mil e novecentos reais), a favor da STN;
g) alteração do cronograma de desembolso do valor mutuado de seis parcelas (para o semi-árido) e oito (fora desse perímetro) para somente quatro, de acordo com o instrumento contratual.
Para o Ministério Público, há indícios suficientes de que ROBERTO SMITH, Presidente do Banco do Nordeste do Brasil, CLÁUDIO VASCONCELOS FROTA, Superintendente de Operações Financeiras do Banco, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES e VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE, Diretores do Banco, além de favorecerem indevidamente às empresas STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE e COMPANHIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA, esta última sua principal acionista, teriam causado prejuízo de plano constatável ao Banco do Nordeste do Brasil - BNB da ordem de R$ 1.499.900,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e nove mil e novecentos reais).
Além disso, estes réus teriam sido responsáveis pela redução tarifária, mesmo sem pedido formal da parte interessada, sem observância das regras postas, a fim de favorecer o consórcio STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE e a COMPANHIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA. Especificamente o réu CLÁUDIO VASCONCELOS FROTA teria inserido a cláusula de redução tarifária no contrato de financiamento sem que qualquer autorização estivesse formalizada documentalmente, bem como teria sido o responsável direto pela redução da quantidade de parcelas de liberação do financiamento.
O Ministério Público Federal aponta, ainda, como indícios das irregularidades envolvendo o contrato de financiamento os fatos apurados pela Comissão de Sindicância do Banco do Nordeste do Brasil - BNB instaurada logo após a prisão de ADALBERTO VIEIRA DA SILVA. Além da participação de Kennedy Moura "no processo de crédito da STN, agindo como uma espécie de articulador entre os dirigentes da STN e da CHESF, bem como suas relações com a empresa de consultoria Enphase Consultoria e escritório Leite, Tosto e Barros", a Comissão de Sindicância apurou que a ENPHASE CONSULTORIA, apesar de contratada formalmente por R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para a elaboração do projeto de financiamento para a STN, recebeu créditos da ordem de R$ 1.970.800,00 (um milhão, novecentos e setenta mil e oitocentos reais). Assim também o escritório de advocacia LEITE, TOSTO E BARROS que, contratado por R$ 606.750,00 (seiscentos e seis mil, setecentos e cinquenta reais), para fazer o assessoramento jurídico da operação, recebeu pagamento no montante de R$ 2.181.900,00 (dois milhões, cento e oitenta e um mil e novecentos reais), o que seria indicativo de que ambas pessoas jurídicas poderiam estar sendo utilizadas para pagamento de vantagens indevidas a terceiros.
Ao fim, o Ministério Público pede a condenação dos réus nas penas no art. 12 da Lei 8.429/92 e a intimação da União e do Banco do Nordeste do Brasil para intervirem no feito.
Em sede cautelar, pediu (a) a indisponibilidade dos bens das pessoas físicas e jurídicas demandadas, como forma de garantir o futuro ressarcimento dos danos causados, assim como o pagamento das multas que decorrem da procedência da ação de improbidade; (b) decretação de quebra do sigilo bancário das empresas STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE S/A, COMPANHIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA S/A e ENPHASE PROJETOS DE INVESTIMENTO E CONSULTORIA LTDA; (c) a disponibilização dos dados de sigilo telefônico do celular de prefixo e número (11) 9235-7215, de titularidade da EATE - Empresa Amazonense de Transmissão de Energia, que era sistematicamente utilizado por Marcelo Tosto de Oliveira Carvalho nos contatos com KENNEDY MOURA no período compreendido entre 01.10.2003 (coincidente com os contatos entre Kennedy e a Enphase) e a data atual; (d) a quebra do sigilo telefônico dos dados relativos às ligações recebidas e realizadas dos terminais (85) 9985-4467 e (85) 9998-4013, que, embora utilizados pelo Deputado JOSÉ GUIMARÃES, não se encontram registrados em seu nome, conforme informação da TIM.
Juntamente com a inicial, o Ministério Público trouxe vasta documentação, dentre as quais peças do inquérito policial instaurado após a prisão em flagrante de JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA, depoimentos prestados ao Ministério Público em sede de procedimento administrativo, peças da auditoria do Tribunal de Contas da União sobre a operação de crédito e cópia da sindicância instaurada pelo Banco do Nordeste do Brasil - BNB.
Os réus foram intimados nos termos do art. 17, § 7.º da Lei 8.429/92, para oferecerem manifestação por escrito (fl. 852), que restaram apresentadas nos seguintes termos:
1.2. Da defesa preliminar apresentada por José Nobre Guimarães:
JOSÉ NOBRE GUIMARÃES apresentou defesa preliminar às fls. 903/922, arguindo, preliminarmente, a inépcia da petição inicial, vez que o Ministério Público Federal não teria indicado em qual dispositivo da Lei 8.492/92 enquadrar-se-ia o defendente.
No mérito, rebateu todas as acusações que lhe são imputadas pelo Ministério Público Federal, argumentando que não há um substrato probatório mínimo que autorize o prosseguimento do feito contra sua pessoa. Aduz que jamais houve qualquer pedido para que KENNEDY MOURA assumisse a responsabilidade por qualquer ato irregular. Disse, ainda, que RAIMUNDA LÚCIA PESSOA DE LIMA e o seu ex-assessor parlamentar, JOSÉ VICENTE FERREIRA, constituíram recentemente a empresa ESTRADA LOCAÇÃO SERVIÇOS E ADMINISTRAÇÃO DE VEÍCULOS LTDA. Argumentou que o próprio ADALBERTO VIEIRA, em seu depoimento no Ministério Público Federal, foi taxativo em isentar o defendente. Afirmou que, em verdade, foi traído na confiança pessoal e política que por anos a fio depositou em ADALBERTO VIEIRA. Destacou, por fim, que o Tribunal de Contas da União já julgou regular a operação de financiamento objeto da presente ação.
Ao fim, pediu o indeferimento da medida cautelar pleiteada pelo Ministério Público contra si e a rejeição da ação de improbidade.
1.3. Da defesa preliminar apresentada por Kennedy Moura Ramos:
KENNEDY MOURA RAMOS apresentou defesa preliminar às fls. 1332/1351, argumentando que o Tribunal de Contas da União - TCU, em julgamento aprovado por unanimidade pelo plenário da Corte, considerou que a operação de financiamento objeto dos autos cumpriu os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade e eficiência.
Disse que o TCU constatou que no exercício 2004 foram realizadas 24 (vinte e quatro) operações estruturadas, não tendo sido a relativa ao STN a única, sendo que 7 (sete) delas envolveram recursos acima de 5% (cinco por cento) do patrimônio líquido do Banco. Sustenta que tais operações envolvem o atendimento a interesse público estratégico para o desenvolvimento da região Nordeste e, por conta da magnitude dos valores envolvidos, geralmente relacionados a obras de infraestrutura de grande porte, devem submeter-se a regramento diferenciado, sob pena de impossibilitar o financiamento em prejuízo ao próprio Banco.
Ressaltou o defendente que, mesmo nessas condições, o contrato verberado tem garantias suficientes, dentre as quais: penhor das ações da empresa ALUSA, penhor dos direitos emergentes do contrato de concessão da obra pública de transmissão elétrica, fiança prestada pela ALUSA, seguros aplicáveis e usualmente praticados no setor elétrico contra todos os riscos a que estiverem sujeitos, com inclusão das apólices de cláusula beneficiária em favor do BNB. Asseverou, ainda, que a redução tarifária de 1,5% (um e meio por cento) para 1,0% (um por cento) está embasada em decisão da Diretoria do Banco, que tinha plena autonomia para fazê-lo.
O defendente argumentou que jamais executou atos que extrapolassem as funções que desempenhava no Banco, aludindo que: "por determinação da Presidência, a Chefia de Gabinete, além de acompanhar todas as ações institucionais do BNB, secretariar as reuniões de Diretoria e do Conselho de Administração, ficou incumbida de monitorar a centralização de informações, acompanhar e cobrar a execução das metas de aplicação e recuperação de crédito junto a Diretores e Superintendentes". Dentro dessas atribuições - prosseguiu - era comum que, na ausência eventual do Presidente do Banco, atendesse pessoalmente aos clientes, algumas vezes acompanhado de Diretores ou Superintendentes da instituição, outras vezes sozinho.
O defendente afirmou que a única relação existente entre si e JOSÉ ADALBERTO VIEIRA deve-se ao fato de ter sido o primeiro o fundador do Partido dos Trabalhadores no Estado do Ceará, e o segundo, à época dos acontecimentos, assessor parlamentar do Deputado Estadual pelo PT, JOSÉ GUIMARÃES. Disse, ainda, que as ligações telefônicas entre ele e ADALBERTO VIEIRA, as quais foram mencionadas pelo Ministério Público, ocorreram em virtude do Processo de Eleições Diretas - PED 2005, eleição à presidência estadual do Partido dos Trabalhadores, sendo ADALBERTO VIEIRA um dos indicados para coordenar o evento, que ocorreu em 28 de agosto de 2005.
Destacou, mais, que, sendo um simples assessor da Presidência do Banco do Nordeste do Brasil, não teria, como quer fazer acreditar o Ministério Público, poderes para influenciar na expedição do Ofício nº 791/2004/MIN, assinado pelo Excelentíssimo Ministro da Integração Nacional, documento indispensável para a liberação do empréstimo.
Com a defesa preliminar, juntou farta documentação e pediu a rejeição da ação de improbidade contra sua pessoa.
1.4. Da defesa preliminar apresentada por Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota:
ROBERTO SMITH, Presidente do Banco do Nordeste do Brasil, VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE e LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES, Diretores do Banco, e CLÁUDIO VASCONCELOS FROTA, Superintendente de Operações Financeiras do Banco, apresentaram defesa preliminar às fls. 1477/1641.
Argumentaram os defendentes que não têm qualquer relação com os valores apreendidos em poder de JOSÉ ADALBERTO VIEIRA e que as relações que o Ministério Público Federal pretende estabelecer entre o flagrante e a concessão do financiamento ao STN carecem de indícios suficientes a deflagrar uma ação de improbidade. As relações e frequentes contatos telefônicos entre ROBERTO SMITH e KENNEDY MOURA eram decorrentes exclusivamente da relação profissional que existia entre ambos, já que o último atuava como assessor especial da Presidência do BNB à época dos fatos.
Os defendentes asseveram que Kennedy Moura respondeu pela chefia do gabinete da Presidência do Banco do Nordeste do Brasil no período de 12.02.2003 até final de 2004, tendo como atribuição institucional o "assessoramento à Presidência, Diretoria e Conselho de Administração na concepção, implementação e monitoração das ações viabilizadoras da missão institucional, provendo visão, disseminando valores e promovendo a articulação entre o corpo diretivo e as demais áreas da instituição". Destacaram que, para o ano de 2004, foi estabelecida uma meta arrojada de incremento da aplicação de recursos do Fundo Constitucional do Nordeste de R$ 1.019 milhões, alcançada em 2003, para R$ 3 bilhões. Nesse contexto, era exigido um esforço concentrado em todas as áreas de atuação do Banco, inclusive da Chefia de Gabinete do Banco em seu papel de articulação. Ressaltaram que o Ministério Público Federal não encontrou quaisquer indícios de interferência de KENNEDY MOURA nas áreas técnicas do Banco que analisaram a operação, nem nos comitês que aprovaram a operação.
Os defendentes invocaram em seu proveito a celeridade com que foi instaurada a Comissão de Sindicância pela Presidência do Banco do Nordeste do Brasil, já no dia 14 de julho de 2005, com o intuito de apurar as possíveis irregularidades denunciadas. Assinalaram que a Comissão, que teve seus trabalhos acompanhados pelo Comitê de Auditoria do Banco do Nordeste, atuou com ampla liberdade e contou, inclusive, com o auxílio da Procuradoria da República e da Polícia Federal. A Comissão concluiu que KENNEDY MOURA RAMOS não participou das discussões técnicas do projeto, tampouco das discussões sobre a concessão do crédito, bem como não obteve provas de que ele tenha auferido alguma vantagem pessoal indevida com a operação.
Nessa linha de raciocínio, afirmaram que os contatos de KENNEDY MOURA com o Ministério da Integração Nacional estariam dentro de suas atribuições institucionais e condizentes com o esforço que aumentou as aplicações do Fundo Constitucional do Nordeste de R$ 256 milhões, de um total repassado de R$ 1,8 bilhão, em 2002, para R$ 4,17 bilhões aplicados em 2005.
Partindo da importância e do caráter estratégico do projeto do consórcio STN - SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE, os defendentes argumentaram que a modificação dos Limites de Endividamento da Programação do FNE foram absolutamente justificáveis em prol do desenvolvimento regional. Segundo os defendentes, não faria sentido manter o limite da participação dos recursos no FNE no investimento em percentual inferior a 10% (dez por cento), já que o financiamento concedido poderia alcançar até 2% (dois por cento) do patrimônio do Fundo. Os dois limites somente seriam observados em projetos que atingissem a cifra de R$ 3,12 bilhões, o que praticamente inviabilizaria qualquer financiamento em projetos considerados estratégicos. Assim, o BNB, por via do ofício GAPRE 2004/0283, de 03 de março de 2004, propôs ao Ministério da Integração Nacional a retirada do esbarro de 10% (dez por cento), proposta esta que foi adotada por meio da Nota Técnica nº 05/GFC/DFC, de 05.03.2004, a qual foi aprovada pelo Excelentíssimo Ministro de Estado da Integração Nacional.
O mesmo se deu quanto ao limite de financiamento. O BNB, através do Ofício GAPRE 2004/0837, de 01.06.2004, solicitou a ampliação do limite de financiamento pelo FNE de 70% (setenta por cento) para 75% (setenta e cinco por cento) do valor total do projeto, com base, inclusive, em normas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, o que foi aprovado por meio da Nota Técnica nº 23/DFD, de 15.06.2004, acatada pelo Excelentíssimo Ministro de Estado da Integração Nacional e comunicada ao BNB através do Ofício 791/2004/MIN, de 17.06.2004.
Assim também com as garantias. Segundo os defendentes, a alteração da Classificação Global da Proposta, cujo risco de crédito passou de "C" (pontuação 5,14) para "AA" (pontuação 9,50) foi absolutamente legal e deveu-se ao fato de que a operação em tela, devido à sua magnitude, fugia aos padrões ordinários de avaliação de riscos de crédito. Em virtude disso, a Diretoria do Banco do Nordeste, mediante proposição das áreas técnicas, aprovou em 13.04.2004 a proposta de Ação Administrativa 2004/618-002, definindo condições complementares para instrução das propostas de crédito relativas aos projetos de grande porte. Nas chamadas "operações estruturadas" é devida uma complementação da avaliação de risco. No caso específico dos autos, a Área de Risco e Análise Operacional do Banco procedeu a "uma avaliação complementar do risco, sempre tomando por base elementos objetivos presentes na proposta de crédito em avaliação, especialmente as garantias elencadas durante a estruturação da operação", inclusive mediante a consulta a empresas de rating e a exigência de amplas garantias que incluíam o seguro conclusion bond e o penhor da totalidade das ações ordinárias da empresa.
A não constituição de provisão para devedores duvidosos nos limites estabelecidos na Resolução Bacen 2682/1999, no valor de R$ 4.499.925,48 (quatro milhões, quatrocentos e noventa e nove mil, novecentos e vinte e cinco reais e quarenta e oito centavos), tanto na contabilidade do Banco como na contabilidade do FNE, seria mera consequência da alteração da Classificação Global da Proposta, cujo risco de crédito passou de "C" (pontuação 5,14) para "AA" (pontuação 9,50), não havendo também que se falar em irregularidade.
Os defendentes citaram a existência de 6 (seis) outras operações estruturadas no ano de 2004, sendo três anteriores e três posteriores ao financiamento concedido ao STN, onde foram observados os mesmos parâmetros. Todas inclusive com aporte de recursos em patamar superior a 5% (cinco por cento) do patrimônio líquido do Banco.
Quanto ao cronograma de liberação dos recursos, os defendentes afirmaram que aí também não houve qualquer benefício ao STN; ao contrário. Na proposta de financiamento, o plano de desembolso estava previsto para 8 (oito) parcelas, a ser realizado no intervalo de 7 (sete) meses. Destacaram que, segundo o Manual de Procedimento - Operação de Crédito do Banco do Nordeste, "as liberações das parcelas do crédito poderão ocorrer em qualquer data, desde que, nas operações de financiamento, esteja sendo observado o cronograma de execução do empreendimento". Sendo assim, o desembolso foi alterado para 4 (quatro) parcelas a ser realizado em 10 (dez) meses. Tal foi resultado de uma opção mais conservadora do Banco que, em um período maior de tempo, poderia constatar com maior segurança a execução do empreendimento. De fato, as liberações de recursos ocorreram nas datas de 02.07.2004, 28.01.2005, 27.4.2005 e 06.10.2005, tendo sido o empreendimento concluído em data de 12.12.2005, conforme noticiou o Operador Nacional do Sistema Elétrico - NOS, por meio da Carta ONS-479/100/2005.
No que diz especificamente com a redução da tarifa de Estudo e Viabilidade Técnica de Projetos, que teria causado um prejuízo ao Banco da ordem de R$ 1.499.900,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e nove mil e novecentos reais), afirmaram que "se trata de ato negocial comum e corrente, o qual, de acordo com os normativos internos do Banco, situa-se dentro da competência do Superintendente Regional, que pode reduzi-la em função da importância econômica do projeto para a Região e do interesse do Banco". Argumentaram que, sendo ato que pode ser aprovado pela Superintendência Regional, de acordo com norma aprovada pela Diretoria, com muito maior razão está a própria Diretoria autorizada a reduzi-la.
Asseveraram, ainda, que tal redução importou em compensações adicionais para o Banco, eis que condicionada a certas vantagens negociais, como captação pelo BNB dos recebíveis do STN, constituição de um Fundo de Liquidez, mediante aplicação financeira de, no mínimo, o valor equivalente a três prestações do financiamento; centralização no BNB da cobrança do STN, compreendendo 187 clientes, entre outras. A título ilustrativo, afirmaram que entre 2003 e 2005 16 (dezesseis) outras operações tiveram a tarifa reduzida. Afirmaram que a redução tarifária não decorreu de decisão pessoal de CLÁUDIO FROTA, mas de decisão da Diretoria do BNB, como se infere do depoimento do peticionante LUIZ ETHEWALDO à comissão de sindicância do BNB.
Os defendentes trouxeram aos autos a notícia de que o Tribunal de Contas da União, em sessão plenária ocorrida em 07.12.2005, por decisão unânime, nos autos do processo nº TC - 012.842/2005, Acórdão nº 2.186/2005 - TCU, concluiu pela regularidade do financiamento objeto da lide nos seguintes termos: "O projeto correspondente à operação analisada apresenta lastro seguro, amparado em contrato de concessão de transmissão de energia elétrica, além de garantias sólidas. Considerações acerca da remuneração de concessionários de linhas de transmissão. Risco negocial praticamente nulo. Indícios de favorecimento não se confirmaram."
Por fim, sustentaram que não praticaram qualquer ato de improbidade administrativa, tendo seguido todas as normas constitucionais, legais e internas do Banco. Argumentaram, ainda, que o BNB, sendo pessoa jurídica de direito privado, não está sujeito ao campo da estrita legalidade, mas ao campo da licitude, podendo praticar atos negociais no amplo espectro da legislação com limites apenas nas vedações da lei e nos princípios insculpidos no caput do art. 37 da CF/88.
Pediram a rejeição de plano da ação proposta, bem como o indeferimento da medida cautelar pleiteada.
1.5. Da defesa preliminar apresentada por Francisco de Assis Germano Arruda:
FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, Diretor do Banco do Nordeste do Brasil, apresentou defesa às fls. 1946/1994 dos autos. Fundamentalmente, reafirmou os argumentos já lançados pelos demais Diretores, Superintendente e Presidente do Banco. Ressaltou, contudo, que não participou das negociações nem da decisão que determinou a redução da tarifa de estudo e contratação de 1,5% ( um e meio por cento) para 1,0% (um por cento) do valor total financiado. Segundo o defendente, a redução é autorizada pela norma interna e foi decidida por alguns Diretores em reunião da qual não participou o defendente, conforme depoimentos do Diretor LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES e CLÁUDIO VASCONCELOS FROTA. Destacou que não existe um só fato, um só elemento de convicção ou indício que possa associá-lo ao dinheiro apreendido com ADALBERTO VIEIRA.
O defendente reafirmou a inteira legalidade da operação de financiamento ao STN e, invocando o ensinamento de autorizados doutrinadores, argumentou que o ato ilegal, para ser caracterizado como ato de improbidade, há ser doloso, ou pelo menos de culpa gravíssima. Ao final, pugnou pelo indeferimento do pedido cautelar em relação à sua pessoa; pediu a decretação do segredo de justiça, ou, subsidiariamente, que os documentos que trouxe aos autos sob os nºs. 07, 08 e 09 sejam mantidos em separado, eis que se trata de atas de reunião do Banco expressamente protegidas pelo sigilo bancário; e requereu a rejeição da ação.
1.6. Da defesa preliminar apresentada por Cia. Técnica de Engenharia Elétrica:
A CIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA apresentou defesa preliminar às fls. 2325/2351. Substancialmente, ratificou os argumentos já trazidos aos autos pelos Diretores, Superintendente e Presidente do Banco, sobretudo quanto aos aspectos técnicos da operação de financiamento ao STN.
Destacou que a diferença entre os valores previstos no projeto de financiamento para pagamento da assessoria prestada por ENPHASE PROJETOS DE INVESTIMENTO E CONSULTORIA LTDA. e pelos serviços advocatícios prestados pelo escritório Leite, Tosto e Barros, que receberam respectivamente R$ 1.970.800,00 (um milhão, novecentos e setenta mil e oitocentos reais) e R$ 2.181.900,00 (dois milhões, cento e oitenta e um mil e novecentos reais), enquanto que o projeto de financiamento previra um pagamento de apenas R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e R$ 606.750,00 (seiscentos e seis mil, setecentos e cinquenta reais), respectivamente, deve-se ao fato de que os valores constantes do projeto precisam ficar dentro dos limites financiáveis pelo Banco, e não representavam os valores efetivamente contratados.
Ao final, pediu o indeferimento da medida liminar de indisponibilidade de bens e a rejeição da ação.
1.7. Da defesa preliminar apresentada por José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima.
JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA e RAIMUNDA LÚCIA PESSOA DE LIMA apresentaram defesa preliminar às fls. 2435/2442. Argumentaram que a quantia que estava sendo transportada pelo primeiro defendente não tem qualquer relação com o financiamento ao STN, mas lhe foi fornecido por um amigo - cuja identificação não poderia ser por eles efetivada - a fim de que fossem iniciados dois empreendimentos comerciais na região onde reside. Ponderaram que o Ministério Público Federal baseou a ação de improbidade em um relatório preliminar da Secretaria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União no Estado do Ceará - SECEX/CE, mas o próprio TCU concluiu, em decisão plenária, de forma inequívoca pela regularidade do financiamento concedido ao STN.
Afirmaram que ADALBERTO VIEIRA tem sólidas e antigas ligações com JOSÉ NOBRE GUIMARÃES e KENNEDY MOURA RAMOS, decorrentes do fato de os três terem sido fundadores do Partido dos Trabalhadores no Ceará e ocuparem postos de relevância no referido partido político. Nesse contexto, não é de se estranhar os contatos telefônicos entre ambos. Destacaram que o Ministério Público não conseguiu provar minimamente a existência de atos de improbidade. Quanto à RAIMUNDA LÚCIA, alegaram que é totalmente indevida sua inclusão no polo passivo da ação de improbidade simplesmente pelo fato de ter um automóvel GM/Corsa 1.8 registrado em seu nome.
Pediram a rejeição a ação de improbidade.
1.8. Da defesa preliminar apresenta por Sistema de Transmissão Nordeste - STN:
SISTEMA DE TRANSMISSÃO NORDESTE - STN apresentou defesa preliminar às fls. 2451/2470. Basicamente, reiterou os argumentos já lançados pelos Diretores, Superintendente e Presidente do BNB e pela CIA TÉCNICA DE ENGENHARIA ELÉTRICA - ALUSA. Destacou que os critérios utilizados para a concessão do financiamento pelo BNB ao STN foram os mesmos que beneficiaram indistintamente outras vinte e quatro pessoas jurídicas. Disse que as normas administrativas do Banco foram alteradas, mas se mantiveram estritamente dentro do que determina a Lei 10.177/01.
Quanto aos pagamentos efetuados à consultoria técnica e jurídica em valores bem acima dos previstos no projeto de financiamento, aduziu que "a STN, em postura absolutamente transparente e do conhecimento do BNB, contratou os profissionais que entendeu hábeis a satisfazer suas necessidades, informando à instituição financeira os valores efetivos dos pactos e limitando a prestação inicial devida a cada um deles ao montante previsto nos normativos do Banco." Indicou o documento 08 como prova de que o Banco foi informado acerca desse fato, embora não o tenha trazido aos autos.
Ao final, argumenta que não há nos autos elementos que autorizem a indisponibilidade de bens pleiteada pelo Ministério Público Federal, tampouco qualquer elemento que indique a necessidade da quebra de sigilo telefônico da EATE - Empresa Amazonense de Transmissão de Energia. Pediu o indeferimento dos pedidos cautelares e o indeferimento da ação.
1.9. Da defesa preliminar apresentada por Enphase Projetos de Investimento e Consultoria Ltda
ENPHASE PROJETOS DE INVESTIMENTO E CONSULTORIA LTDA também apresentou defesa preliminar (fls. 2.601/2.634). Nesta, fundamentalmente destacou que atua no ramo de assessoria técnica, especificamente para financiamento junto a órgãos públicos, há mais de dez anos. Seus sócios têm larga experiência na área. Todos os sócios originários foram estagiários do SEBRAE/CE, onde laboravam na área de projetos precipuamente junto ao BNB. A empresa presta serviços para diversas empresas e está devidamente cadastrada junto ao BNB e junto à SUDENE.
Afirmou que os valores recebidos da STN, no total de R$ 1.970.817,36 (um milhão, novecentos e setenta mil, oitocentos e dezessete reais e trinta e seis centavos), foram fruto do contrato de assessoria técnica assinado entre ambas. Essa quantia corresponde a 0,7% (zero vírgula sete por cento) do valor financiado, já descontados os impostos de retenção obrigatória pela empresa contratante. Juntou aos autos o contrato firmado, as notas fiscais emitidas e o comprovante do pagamento dos tributos, argumentando que a discrepância entre o valor constante do projeto como verba destinada ao pagamento da assessoria técnica (R$ 20.000,00) e os valores efetivamente recebidos deve-se ao fato de que esse é o limite de financiamento da assessoria técnica estabelecido nos normativos internos do BNB.
Disse a defendente que sua relação com KENNEDY MOURA RAMOS era estritamente profissional, eis que ele ocupava a Chefia de Gabinete da Presidência do BNB e tinha por função, dentre as suas atribuições institucionais, atender aos clientes do Banco e desenvolver soluções para a viabilização dos projetos. Destacou que os encontros aludidos pelo Ministério Público Federal entre KENNEDY MOURA e a defendente, em data anterior à entrada do requerimento de financiamento da STN junto ao Banco, tinham por fim tratar de projetos de outros clientes para os quais estava também prestando serviço no mesmo período, dentre os quais cita Ultrassom Diagnósticos e Serviços S. C. Ltda.
Argumentou que não pode figurar como ré na presente ação, eis que, por sua própria condição, não pode praticar ato de improbidade, nem dele ter-se-ia beneficiado, eis que todos os recursos recebidos o foram do STN, não de qualquer órgão público, e em virtude de um contrato de assessoria técnica regularmente firmado. Ao final, pugnou pela rejeição da ação.
Nos termos da decisão de fls. 2.723/2.746, entendeu-se por receber a presente Ação de Improbidade em relação a todos os réus, decretando segredo de justiça, ao mesmo tempo em que restaram determinadas várias medidas de natureza cautelar, entre as quais: a indisponibilidade de bens do réu José Nobre Guimarães, o depósito judicial da importância de R$ 5.999.600,00 pelo réu STN - Sistema de Transmissão Nordeste S/A, sob pena de bloqueio de bens, a quebra do sigilo bancário das empresas rés, a quebra do sigilo telefônico do celular (11) 9235-7215, de titularidade da EATE - Empresa Amazonense de Transmissão de Energia, e dos celulares utilizados por José Guimarães, de prefixos e números (85) 9985-4467; (85)9998-4013, em período que se fixou.
Contra a referida decisão, que recebeu a presente Ação de Improbidade e determinou várias medidas cautelares, opuseram-se, através de Agravo de Instrumento, o STN - Sistema de Transmissão Nordeste S/A às fls. 2.826/2.837 (AGTR 67.913-CE), José Nobre Guimarães às fls. 2.867/2.892 (AGTR 68.148-CE), Francisco de Assis Germano Arruda às fls. 2.947/3.003 (AGTR 68.143-CE), Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponde, Luiz Ethevaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota às fls. 3.005/3.072 (AGTR 68.224-CE), Ênphase Projetos de Investimentos e Consultoria LTDA às fls. 3.202/3.219 (AGTR nº 68.347-CE), Cia Técnica de Engenharia Elétrica às fl. 3.223/3.246 (AGTR 68.335-CE), no bojo dos quais deferiu-se liminarmente a suspensão da eficácia do decisum recorrido, ora para tornar sem efeito em favor de cada agravante a medida cautelar determinada, ora decretar o sobrestamento do trâmite da própria Ação de Improbidade, até julgamento final dos agravos, conforme decisões de fls. 2.812/2.817, 3.378/3.380, 3.077/3.081, 3.082/3.083 (esclarecimentos sobre a extensão dos efeitos da decisão liminar exarada no AGTR 67.913-CE interposto pela STN - Sistema de Transmissão Nordeste S/A), 3.454/3460, 3.502/3.506 e 3.483/3.488. Já o réu Kennedy Moura Ramos interpôs Agravo de Instrumento às fls. 3.248/3.273 (AGTR 68.377-CE), que restou não provido, conforme decisão de fls. 4.191/4.197.
A determinação de quebra do sigilo telefônico do celular de prefixo e número (11) 9235-7215 foi suspensa nos autos do Mandado de Segurança MSTR 94.194-CE, conforme decisão de fl. 3.443/3.445.
A União Federal manifestou seu interesse na lide à fl. 2.821, requerendo, ainda, a sua intimação de todos os atos do processo.
Regularmente citados, os réus apresentaram contestação.
José Nobre Guimarães contestou a ação às fls. 2.896/2.915, arguindo, preliminarmente, a inépcia da inicial, ante a não indicação do dispositivo violado da Lei 8.429/92. No mérito, pugnou pela improcedência dos pedidos, aludindo para tanto o seguinte:
- Que o próprio Ministério Público reconheceu em fragmentos da inicial a fragilidade das provas em seu desfavor, tendo, inclusive, admitido "que a pretensão deduzida nesta ação poderá naufragar".
- Que "não tem qualquer participação, direta ou indireta, próxima ou remota, com a prática ilícita perpetrada pelo Senhor Adalberto Vieira e os fatos que a ensejaram".
- Que nos dias que antecederam a prisão de Adalberto Vieira teria viajado a São Paulo e Brasília para tratar de assuntos afetos à crise no PT nacional e outros relacionados ao desempenho de seu mandato, colacionando aos autos a respectiva documentação.
- Que soubera da prisão de Adalberto Vieira quando estava em São Paulo, através do Sr. Kennedy Moura, não tendo conhecimento prévio da presença do referido senhor naquela capital, tampouco dos motivos de sua viagem.
- Que intercedeu junto ao Presidente do BNB, Professor Roberto Smith, invocando "razões de estado", no sentido de que o Sr. Kennedy Moura fosse a São Paulo "elucidar os fatos que naquele momento assumiam proporção de escândalo nacional".
- Que juntamente com outros líderes nacionais do PT indagou a Kennedy sobre o gravíssimo incidente, fato posteriormente confirmado através de declarações à grande mídia.
- Que juntamente com José Genuíno sofreu as consequências políticas e pessoais por atos criminosos que não perpetrou e a que não deu causa.
- Que jamais houve qualquer pedido para que Kennedy Moura assumisse "o que quer que seja".
- Que a esposa de José Adalberto Vieira da Silva, Srª Raimunda Lúcia Pessoa de Lima, e o Sr. José Vicente Ferreira, ex-assessor do contestante, constituíram a empresa Estrada Locação Serviços e Administração de Veículos LTDA, e que a passagem de Adalberto foi paga por Vicente, o que seria indicativo de que o dinheiro apreendido era destinado a financiar tal empreendimento.
- Que procedeu incontinenti à exoneração de José Adalberto da Silva e de José Vicente Ferreira de sua assessoria.
- Que foi traído na confiança pessoal e política que por anos depositou em Adalberto Vieira.
- Que foi isentado de qualquer culpa por Adalberto em seu depoimento prestado perante o Ministério Público Federal.
- Que é inocente, tem a consciência tranquila e nunca pediu dinheiro a Kennedy e a Adalberto, não tendo qualquer influência nas rotinas administrativas do Banco do Nordeste do Brasil, "tampouco tem ou teve qualquer ligação com o consórcio STN - Sistema de Transmissão Nordeste S/A, com Companhia Técnica de Engenharia Elétrica - ALUSA S/A, ARC Consultores S/C LTDA., Leite e Tosto Advocacia, Enphase Consultoria, nem mesmo conhecendo titulares ou prepostos seus".
- Que o inquérito nº 2-3599/05, que teve tramitação na Superintendência da Polícia Federal de São Paulo, contra si "nada, rigorosamente nada apurou em relação a qualquer participação, próxima ou remota, direta ou indireta, com todo o imbróglio".
- Que o Tribunal de Contas da União já deliberou sobre a lisura da "operação de empréstimo a que alude os membros do Ministério Público Federal", de modo a "desmontar toda a tese ministerial", a qual teria como "pilastra de sustentação a premissa de que os dinheiros apreendidos em poder de Adalberto Vieira constituíam propina paga pela liberação graciosa de empréstimo bancário", não havendo que se falar em favorecimentos, exploração de prestígio ou propina.
- Que a procedência da ação de improbidade administrativa requer a existência de dolo e de má-fé "a animar a ação dos envolvidos", não verificada in casu.
- Que seria inequívoca a ausência dos requisitos do periculum in mora e fumus boni iuris, pelo que oportuna a revogação das medidas cautelares deferidas.
O consórcio réu STN - Sistema de Transmissão Nordeste S/A apresentou contestação às fls. 3.086/3.095, ratificando na oportunidade integralmente o conteúdo defensivo suscitado por ocasião de sua defesa prévia, sustentando, ainda, que quase a totalidade das acusações que lhes são imputadas teria por base fática única e exclusivamente o relatório preliminar da SECEX-CE para o TCU - Tribunal de Contas da União, à exceção da redução de tarifa de estudos de 1,5% para 1%, e que os fatos associados à prisão do assessor do Deputado Guimarães nada mais seriam do que "o pano de fundo para introduzir, como caso de improbidade a contratação e a redução de tarifa a que se procedeu".
Destacou que embora o julgamento do Tribunal de Contas, reconhecendo a regularidade da operação de financiamento de que se trata, não impeça a discussão da improbidade, "não se pode negar que, quando o posicionamento do TCU fundamenta a alegação de improbidade, a confirmação, por aquele mesmo órgão, da legalidade da conduta tida por ímproba finda por afastar qualquer alegação fundamentada na presença de lesão ao Erário".
Relatou ser assente no STJ que a improbidade demanda existência de dano ao patrimônio público e prova do elemento subjetivo (dolo ou culpa) e que o referenciado primeiro requisito seria provado única e exclusivamente através do exame a que procedeu a Corte de Contas, relativamente ao financiamento sub judice, que, no entanto, nada encontrou de desabonador na contratação firmada entre o BNB e o contestante, de modo a afastar qualquer alegação de infrações às normas dos arts. 9º e 10º da Lei 8.429/92, e, por consequência lógica, da prática de improbidade.
Por fim, não seria lesiva a redução da tarifa de estudos de 1,5% para 1%, tendo em vista a sua previsão nos normativos do Banco (BNB) e a observância aos seus limites.
Trouxe com a contestação os documentos de fls. 3.096/3.191.
Em sua contestação de fls. 3.279/3.302, o réu Kennedy Moura Ramos pugnou pelo reconhecimento da inexistência de ato de improbidade, uma vez que os alegados telefonemas entre ele, Adalberto e o Deputado Guimarães sequer constituir-se-iam em indícios suficientes para justificar o seu envolvimento em ato de improbidade administrativa, sendo certo que a quebra do sigilo telefônico de vários dos promovidos não teria comprovado quaisquer tratativas relacionadas ao Banco do Nordeste, e muito menos a prática de atos ilícitos.
Destacou que o vínculo que uniria o contestante, Adalberto e o Deputado Guimarães seria tão-somente suas filiações ao Partido dos Trabalhadores e que nas mencionadas ligações telefônicas eles trataram sobre a crise política enfrentada pelo partido em âmbito nacional e acerca da eleição para a sua presidência estadual.
Verberou inexistir qualquer anormalidade nas ligações telefônicas que manteve com os representantes da empresa Enphase Projetos de Investimento e Consultoria Ltda, tratando-se esta de empresa regularmente autorizada pelo BNB a prestar serviços de consultoria para clientes da instituição que solicitam financiamento, antes mesmo dos fatos descritos na inicial.
Relatou ser comum o "contato dessas empresas com alguns setores e mesmo como a Presidência do Banco, com a finalidade de solicitar informações, verificar alterações nos procedimentos da instituição e outros dados referentes aos seus serviços prestados, não havendo nisso conduta de improbidade", e que a inicial teria como fundamento meras hipóteses alusivas a acontecimentos que não se relacionam, não sendo crível acolher-se como verdadeira a alegação de que "um assessor da presidência do BNB" pudesse intervir em decisões do Ministério, máxime diante de sua notória desavença com o Ministro da Integração à época dos fatos exordiais.
Informou que na condição chefe de gabinete da Presidência do BNB tinha sim contato com diretores, superintendentes e determinados clientes da instituição financeira, convocando reuniões quando necessário para a integração das diversas áreas do Banco na busca de seus objetivos institucionais, não se olvidando que no ano de 2004 foram traçadas metas ousadas, a exemplo do aumento do volume das aplicações com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste de R$ 1.019.000,00 para R$ 3.000.000.000,00, sendo ainda atribuição da referida chefia acompanhar a execução das metas de aplicação e recuperação de crédito junto aos Diretores e Superintendentes, participando o contestante, sozinho ou acompanhando o Presidente do Banco, de reuniões com entidades de classe, grupos empresariais, representantes dos diversos órgãos estatais e instituições internacionais, não tendo sido diferente por ocasião da contratação do financiamento pelo Consórcio STN, já que tê-lo na "carteira de clientes era interesse da instituição financeira". No entanto, jamais teria exorbitado de suas atribuições ou agido de forma ímproba.
Referenciou que o próprio Presidente e os Diretores do BNB confirmaram que o contestante não intervinha nas tomadas de decisões da instituição, fato este também comprovado em sindicância do Banco, e que em suas investigações o MPF não levantou qualquer indício de que tivesse "solicitado a qualquer técnico ou instância de análise ou decisão de crédito para praticar ou deixar de praticar atos que violassem os princípios da Administração Pública".
Aludiu que seu patrimônio "é perfeitamente compatível com seus ganhos, não havendo qualquer indício de enriquecimento ilícito", não se sustentando, desse modo, a tese do Parquet no sentido de que teria obtido ganhos patrimoniais em razão de sua atuação.
Dissertou sobre a regularidade do contrato, referenciando que nas defesas preliminares tal condição restou assentada e que a inicial de improbidade fundamenta-se em relatório preliminar da SECEX, o qual não foi acolhido em julgamento pelo pleno do Tribunal de Contas da União.
Enalteceu que, contrariamente às alegações ministeriais, nos termos do julgamento do TCU, a "operação estruturada", também adotada por outras instituições financeiras com o escopo de fomentar o desenvolvimento específico de áreas de infraestrutura, não teria sido criada para beneficiar o Consórcio STN em burla às normas pré-estabelecidas pelo Banco, uma vez que operação de mesma natureza teria beneficiado mais de 24 outros grupos empresariais, sendo duas delas anteriormente à contratada com o referido consórcio, com as empresas TELEMAR E MAXITEL, e uma outra, com a BRASKEM, na mesma data em que foi celebrada a operação com o STN, tudo em estrita observância ao princípio da impessoalidade, de modo a desqualificar as alegações exordiais de adoção de critérios subjetivos e favorecimento ao citado consórcio. Acerca das garantias ofertadas pelo consórcio promovido consistentes no penhor de ações e no penhor dos direitos emergentes do contrato de concessão, previstas na cláusula décima quinta da avença, afirmou que não são de natureza diversa daquelas praticadas no mercado financeiro para essa modalidade de financiamento, destacando que o TCU teria qualificado-as em seu relatório como "totalmente sólidas".
No que concerne à redução da tarifa de contratação de 1,5% para 1%, disse que seu estabelecimento é ato negocial comum e corrente, inserto pelos normativos do Banco na competência do Superintendente Regional, "que pode reduzi-la em função da importância econômica do projeto para a Região e do interesse do Banco" em manter relacionamento comercial com o cliente beneficiário de empréstimo de longo prazo. Verberou que aludida redução constou da Proposta de Ação Administrativa nº 2004/0626-185, aprovada pela Diretoria.
Arrematou, aludindo que a sua conduta e a formalização do contrato de financiamento entre o BNB e STN não violaram os princípios da Administração Pública e que em momento algum praticou ato que não estivesse autorizado na lei, nos regulamentos do ministério e em normas internas do Banco, derivando daí a estrita submissão ao princípio da legalidade, mencionando ainda que a jurisprudência do TRF-5ª Região é no sentido da "impossibilidade de proposição de Ação de Improbidade Administrativa antes do desfazimento do ato do Tribunal de Contas da União por uma ação própria".
Também os réus José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima contestaram o feito às fls. 3.548/3.563, aduzindo, em suma, que a exordial assemelha-se a "um enredo cheio de sensacionalismo para tentar dar supedâneo ao final que já se encontrava escrito" e que as relações entre o primeiro peticionário e os réus Kennedy Moura e José Guimarães derivariam de suas condições de fundadores do Partido dos Trabalhadores no Ceará e ocupantes de posições de destaque na referida agremiação política, a revelar uma conduta absolutamente normal, demonstrando a fragilidade das alegações do autor.
Além disso, o MPF estaria a tentar "erigir à categoria de "fatos reais" suposições suas extraídas a partir de avaliações preliminares e matérias de jornais", o que seria "insuficiente para demonstrar eventual benefício que os peticionários pudessem ter auferido mercê do indigitado ato de improbidade", máxime em tendo o TCU - Tribunal de Contas da União julgado "o empréstimo impugnado como legal e vantajoso à instituição financeira".
Alegaram que, em conformidade com a norma do art. 333 do CPC, seria do MPF o ônus de provar que o primeiro requerente "teria se encontrado com o funcionário de uma das co-rés para receber os valores de que estava de posse quando foi detido" e de que teria "participado do 'suposto' ato de improbidade". Asseveraram que não são funcionários do BNB ou mesmo do corréu STN, pelo que desconhecem completamente os termos do contrato de financiamento impugnado, não participando nem de forma indireta da negociação ou conclusão da citada avença, sendo certo inexistir comprovação nos autos de que auferiram quaisquer vantagens patrimoniais em decorrência do sinalagmático.
Destacaram ter o MPF pretendido fazer crer que havia manifestação efetiva do TCU acerca da matéria sub judice, quando havia, no momento inicial, tão-somente simples análise preliminar realizada por órgão local e ainda dependente do crivo da própria Corte de Contas e que os "valores apreendidos nada tem haver com os fatos articulados nesta demanda".
A CIA Técnica de Engenharia Elétrica contestou a ação, arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal para defender o patrimônio do BNB, supostamente afetado com a redução da tarifa bancária de contratação de 1,5% para 1%, e a inépcia da petição inicial por ausência de capitulação legal. Quanto ao mérito, apontou a impropriedade do fundamento adotado na decisão de recebimento da presente ação, segundo o qual a decisão do TCU, reconhecendo a regularidade do empréstimo obtido do BNB pelo STN, não seria suficiente para afastar as alegações exordiais, "visto que tal ato poderia estar eivado de imoralidade administrativa", tendo em vista partir esse raciocínio do "pressuposto de que todos são desonestos".
Afirmou ser "absolutamente incorreto asseverar que somente a STN foi beneficiada, no ano de 2004, pelas diversas alterações nos regulamentos do FND e nos regulamentos internos do BNB", e que nenhum dos fatos trazidos pelo autor levaria, sequer em tese, à configuração de ato de improbidade, "tudo não passando de mera especulação", sendo certo que a Lei 8.429/92 exigiria indícios suficientes (§ 6º do art. 17), e não meras conjecturas.
Referenciou que "o plantel de irregularidades imputadas à contratação do financiamento" derivaria única e exclusivamente de relatório preliminar da SECEX-Ceará, que ao fim e ao cabo não restou referendado pelo TCU - Tribunal de Contas da União, e que, em fundamentando a alegação de improbidade o referido relatório do TCU, "a confirmação, por aquele mesmo órgão, da legalidade da conduta tida por ímproba finda por afastar qualquer alegação fundamentada na presença de lesão ao Erário", havendo de prevalecer o julgamento do TCU, salvo no caso de ser reconhecido como equivocado pelo Judiciário. Logo, embora o julgamento do TCU não afaste a discussão sobre improbidade, ele deve prevalecer em inexistindo outras provas que não os fatos que se constituíram objeto de seu julgamento reconhecendo as suas regularidades, de modo a afastar, in casu, qualquer alegação de improbidade fundada nos artigos 9º e 10º da Lei respectiva.
Demais disso, no que se refere aos atos de improbidade por lesão aos princípios da administração pública, tratados no art. 11 da Lei 8.429/92, enalteceu, com esteio em entendimento do STJ, que a sua constatação exige a comprovação do elemento subjetivo, consubstanciado no dolo ou culpa, que nos autos não passaria de "especulações maldosas, ilógicas e inverossímeis", que acabaram sendo acolhidas por ocasião do recebimento da petição inicial. Fixou que "qualquer alegação de dolo ou culpa exige um mínimo de lógica para que se estabeleça uma razão de ser para a prática dos atos indevidos".
Afastou, ainda, qualquer anormalidade na redução da tarifa cobrada pelo Banco do Nordeste de 1,5% para 1%, não merecendo acolhimento a alegação de irregularidade, por ter derivado referida redução de uma decisão não registrada da Diretoria do Banco, muito embora tenha sido objeto da Proposta de Ação Administrativa nº 2004/626-185, sendo certo que, nos termos da jurisprudência sedimentada do STJ, não configuraria improbidade a mera irregularidade formal, a exemplo da ausência de registro da reunião onde tal redução foi decidida.
Pugnou, ao final, pela total improcedência da demanda.
O Ministério Público Federal fez juntar aos autos às fls. 3.604/3.624 relatório de auditoria especial da Controladoria-Geral da União alusivo à operação de crédito nº 44.2004.1398, que tem como parte o Sistema de Transmissão Nordeste - STN.
Juntou-se aos autos às fls. 3.629/3.697 ofício 600/2006-TCU/SECEX-CE, em que os "auditores responsáveis pela elaboração do relatório preliminar reconhecem a regularidade da operação com a STN", com fulcro no qual se requereu a rejeição da ação, cuja apreciação restou postergada para após manifestação do Eg. TRF-5ª Região em sede de Agravo de Instrumento.
Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota contestaram a ação às fls. 3.708/3.851, arguindo, preliminarmente, a incompetência da Justiça Federal para conhecer da presente ação de improbidade, porquanto o prejuízo patrimonial possivelmente experimentado em razão da redução da tarifa bancária de 1,5% para 1% tem como destinatário o próprio BNB. No tocante ao mérito, após descrever longamente sobre o verdadeiro papel de cada um dos contestantes, entre outros fundamentos, concluíram pela absoluta regularidade da operação de financiamento subjacente aos fatos exordiais, inclusive no que concerne à "alteração da classificação global da proposta, cujo risco de crédito passou de "C" (pontuação 5,14) para "AA" (pontuação 9,50)", e à redução da tarifa, a existência de outras operações estruturadas, tal como a sub judice, inclusive anteriores à da STN, a inexistência de dano ao erário reconhecida pelo Tribunal de Contas da União, a questionável validade do relatório preliminar da SECEX/TCU como documento que contenha indícios suficientes da existência de ato de improbidade, cujos equívocos nele contidos foram posteriormente reconhecidos pela própria SECEX/TCU, a relevância e a presunção de validade, veracidade, eficácia e certeza das decisões do Tribunal de Contas da União quando decorrentes de sua atuação na forma prevista na norma do art. 71, II, da Constituição Federal, o alcance da norma do art. 21, II, da Lei 8.429/92, condicionada à desconstituição e/ou questionamento judicial da decisão do TCU, materialmente judicial, a inocorrência de improbidade administrativa, assim como a presunção de veracidade e eficácia da decisão do TCU, cuja desconstituição submeter-se-ia aos ônus da prova a cargo do autor.
Quanto aos pedidos cautelares, verberaram não demonstrados os requisitos da "fumaça do bom direito" e do "perigo de demora".
Instruíram a inicial com anexo de jurisprudência de fls. 3.837/3.851.
Francisco de Assis Germano Arruda contestou a ação às fls. 3.853/3950, suscitando, preliminarmente, a incompetência absoluta da Justiça Federal para o feito, com esteio nos mesmos argumentos dos demais funcionários do BNB. Enfatizou, quanto ao mérito, dentre outros fundamentos, o significado das operações estruturadas, que se refeririam a "operações de créditos que fogem da modelagem padrão das operações tradicionais", e que seriam "construídas 'sob medida' para ajustarem-se às características particulares de projetos específicos", associadas, em geral, "às características do mercado, ao tempo de maturação do projeto e ao tipo de garantia", a regularidade e legalidade da operação com a STN, a conformidade com a lei da alteração na programação do FNE, medida de ordem geral e plenamente justificada, e o baixo risco da operação realizada entre o BNB e o consórcio STN.
Destacou, ainda, como justificável a alteração do cronograma de desembolso, muito embora referido ato não lhe possa ser atribuído, a ausência de tipicidade, lesividade, injuridicidade e culpabilidade relativamente ao contestante, a completa carência de evidência na prática de atos de improbidade, a inexistência de ofensa aos princípios da administração e a inaplicabilidade in casu do art. 11, I da Lei de improbidade, a inexistência de ilegalidade e de prejuízo ao erário em razão da redução da tarifa bancária de 1,5% para 1%, pelo que não incidente a norma do art. 10, VI da Lei 8.429/92, e a aplicação aos atos de improbidade do princípio da presunção de inocência, requerendo ao final a improcedência da ação.
Trouxe com a defesa os documentos de fls. 3.951/3.972.
Enphase Projetos de Investimento e Consultoria LTDA contestou a ação às fls. 3.998/4.040, suscitando, preliminarmente, a inépcia da inicial, ao argumento de que o MPF não imputou especificamente à empresa ré a prática de ato que possa ser tipificado como ímprobo, sendo a narrativa inicial "vazia e evasiva". Verberou, quanto ao mérito, após destacar pormenorizadamente o fluxograma que percorreu na prestação do serviço para o qual fora contratada, a validade das conclusões da comissão de sindicância do Banco do Nordeste, a legalidade fiscal do recebimento dos valores oriundos da prestação de serviço e a regularidade da operação de crédito realizada entre o BNB e a STN atestada pelo TCU.
Insurgiu-se, também, contra a inclusão de seu nome no presente processo mesmo sem ter sido ouvida na sindicância designada pelo BNB, a qual teria apurado, "de forma teratológica, que a Contestante supostamente havia recebido valores acima do indicado no quadro de usos e fontes, constante do projeto", razão pela qual, com espeque nos fundamentos expendidos, requereu a improcedência da ação.
Anexou à sua contestação os documentos de fls. 4.043/4.183.
À exceção do Agravo de Instrumento nº 67.913-CE, ao qual se deu parcial provimento unicamente para assegurar a redução da multa fixada no juízo a quo, todos os demais Agravos de Instrumento interpostos pelos réus da demanda foram meritoriamente improvidos pelo Eg. TRF-5ª Região, cessando-se desse modo os efeitos liminares de sobrestamento do feito a eles emprestados inicialmente pela Corte Regional, razão pela qual, nos termos da manifestação judicial de fl. 4.311, determinou-se o prosseguimento do feito.
Réplica do Ministério Público Federal colacionada às fls. 4.324/4.329.
Requereu-se a produção de provas às fls. 4.340/4.341, 4.342/4.343 (4.445/4.446), 4.347/4.348, 4.351/4.366, 4.377/4.378, 4.386/4.387 e 4.040/4.041.
O réu José Nobre Guimarães noticiou às fls. 4.389/4.392 a admissão do Recurso Especial interposto em face da decisão de não provimento proferida pelo TRF-5ª Região nos autos do Agravo de Instrumento esgrimido em face da decisão de recebimento da presente Ação Civil Pública.
Termo de audiência inaugural de instrução, estabelecendo os pontos controvertidos, deferindo as provas documental, oral e pericial, inclusive com nomeação da perita, e desacolhendo a preliminar de inépcia da inicial, encartado às fls. 4.453/4.455 dos autos.
Cópia da sentença exarada na Ação Cautelar nº 2005.81.00.013486-1 trasladada às fls. 4.482/4.490.
Decisão de fls. 4.505/4.506, deferindo os quesitos apresentados pelas partes, elaborando outros e determinando a intimação da perita para oferecimento da proposta de honorários.
À fl. 4.521, acolhendo pleito do réu José Adalberto Vieira da Silva, após a anuência do MPF, foi determinado o levantamento da restrição aposta em veículo de sua propriedade.
Proposta de honorários da perita às fls. 4.526/4.527.
Despacho de fl. 4.528, determinando a intimação dos réus para deposito dos honorários periciais no prazo de 10 (dez) dias, conforme o disposto no art. 33 do CPC.
Em face do despacho referido, o réu Roberto Smith opôs embargos declaratórios (fls. 4.532/4.540), pugnando pelo reconhecimento da responsabilidade do MPF quanto à obrigação de recolher os honorários periciais, em razão de a prova ter sido requerida por todos os litigantes, ou, alternativamente, pela definição do percentual que competiria a cada uma das partes relativamente à verba.
Por meio da decisão de fls. 4.558/4.560, foram acolhidas parcialmente as razões invocadas pelo réu Roberto Smith, apenas para o fim de estabelecer aos requerentes da prova pericial, quais sejam, o peticionante, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota, que depositassem os honorários periciais estipulados no prazo de 10 (dez) dias, competindo a cada réu mencionado 25% da verba. Ficou consignado que o depósito parcial ou a ausência total dele seria considerado manifestação de desistência da prova.
Manifestação judicial de fls. 4.583/4.584, declarando a verificação da "desistência tácita à realização da prova pericial", ante o não recolhimento dos honorários periciais fixados.
Decisão de fls. 4.613/4.618, deferindo a juntada do Inquérito Policial nº 1143/2008 como prova documental, assim como o depoimento pessoal dos réus e das testemunhas arroladas.
Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota informaram às fls. 4.735/4.755 que interpuseram Agravo de Instrumento em face da decisão de fls. 4.613/4.618, oportunidade em que foi indeferida a pretensão de exclusão/desconsideração do Inquérito Policial nº 1143/2008, protocolado no TRF-5ª Região sob nº AGTR nº 114729/CE, ao qual se negou provimento, conforme se constata às fls. 5.180/5.188.
Colacionaram-se às fls. 4.759/4.810 os originais das decisões exaradas nos autos do Agravo de Instrumento nº 68.145-CE, interposto por José Nobre Guimarães, bem como de certidão dando conta de sua tramitação na forma eletrônica, após digitalização e armazenamento no "sistema integrado da atividade judiciária do Superior Tribunal de Justiça". Também foi providenciada às fls. 4.833/4.938 a colação dos originais das decisões exaradas no Agravo de Instrumento nº 68.143-CE, interposto por Francisco de Assis Germano Arruda.
Depoimentos das testemunhas arroladas às fls. 4.445/4.446 por Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota constantes das fls. 4.979/4.981 (Roberta Carvalho de Alencar), 5.067v/5.068 (Ernesto Lima Cruz), 5.068/5.068v (Moacir Silva Torres), 5.068v/5.069 (Sérgio Maia de Farias Filho), 5.100/5.101 (Guido Antônio da Silva Carneiro).
Depoimento de testemunha arrolada às fls. 4.347/4.348 por Kennedy Moura Ramos constante às fls. 5.067/5.067v (Marcelo Guimarães Rêgo).
O Banco do Nordeste informou à fl. 5.174 que adota a "política de flexibilizar a cobrança de tarifa bancária no seu processo de crédito, procedimento este que vem sendo utilizado anteriormente ao ano de 2000". Informou, ainda, que, em consulta no sistema de tramitação de proposta de crédito, teria identificado 43 com pedido de flexibilização de tarifas bancárias com base na Proposta de Ação Administrativa (PAA) 2004/0626-185, de 27/02/2004.
Na audiência realizada em 05/03/2012, conforme termo de fls. 5.287/5.290, o MPF desistiu do depoimento dos réus, à exceção do de José Adalberto Vieira Silva, Raimunda Lúcia Pessoa de Lima, Kennedy Moura Ramos e José Nobre Guimarães. Na ocasião, restou indeferido o pedido dos réus José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima de dispensa de sua oitiva, assim como o pedido do réu José Nobre Guimarães de sobrestamento das audiências para a oitiva das testemunhas, até o cumprimento das precatórias expedidas para a ouvida dos corréus. Nessa mesma audiência, colheu-se o depoimento pessoal do réu Kennedy Moura Ramos, gravado em forma de áudio e vídeo, cuja mídia encontra-se encartada nos autos e sob custódia da Secretaria da 10ª Vara.
Na audiência realizada em 07/03/2012, conforme termo de fls. 5.345/5.346, o representante legal do réu José Nobre Guimarães requereu a desistência da oitiva das testemunhas Andréa Maria Gondim Lucetti e Eudoro Walter de Santana, da mesma forma o fazendo o representante legal dos réus Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota, relativamente às testemunhas José Valter Bento de Freitas e Haroldo César Frota Bezerra. Na mesma audiência procedeu-se à tomada do depoimento das testemunhas Henrique Jorge Tinoco de Aguiar, Joaquim Cartaxo Filho e Francisco de Assis Diniz, gravado em forma de áudio e vídeo, cuja mídia encontra-se encartada nos autos e sob custódia da Secretaria da 10ª Vara.
Na audiência realizada às 9:00 h do dia 08/03/2012, conforme termo de fls. 5.353/5.359, o representante legal da ré Enphase Projetos de Investimento e Consultoria LTDA requereu a desistência da oitiva das testemunhas Fernando Passos, Francisco Eugênio Pinheiro, Nélson Cláudio Oliveira e Paulo Roberto Medeiros Braun, esta em razão de seu falecimento. Na mesma audiência, tomou-se o depoimento das testemunhas Antônio Carlos R. de Souza e Romildo Carneiro Rolim, arroladas conjuntamente por Enphase Projetos de Investimento e Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota, e das testemunhas Philip Magno dos Anjos Borges e Francisco de Assis Carneiro, arroladas tão-somente por Enphase Projetos de Investimento. Por fim, no mesmo dia 08/03/2012, às 14:00 h, ouviu-se antecipadamente a testemunha José Macedo Barbosa a pedido do advogado Licurgo Tertulino de Oliveira, que também requereu a desistência das demais testemunhas que seriam ouvidas na audiência designada para o dia 09/03/2012, dando ensejo ao seu cancelamento, restando todos os depoimentos gravados em forma de áudio e vídeo, cuja mídia encontra-se encartada nos autos e sob custódia da Secretaria da 10ª Vara.
A União Federal, à fl. 5.366, manifestou a ausência de interesse em compor o polo ativo da demanda, oportunidade em que requereu a desistência do pedido de vista dos autos formulado na audiência do dia 05/03/2012 (fls. 5.287/5.290), assim como daquele formulado em petição datada de 27/04/2006, quando teria requerido sua intimação de todos os atos do processo.
O consórcio STN requereu à fl. 5.367 a juntada do parecer de fls. 5.369/5.407.
Na audiência realizada às 10:00 h do dia 26/03/2012, conforme termo de fl. 5.441, deferiu-se o pedido de desistência da ouvida da testemunha Eliane Líbano Brasil de Matos arrolada pela ré Enphase Projetos de Investimento, procedendo-se na mesma audiência à oitiva da testemunha Ivo Ferreira Gomes, arrolada pelo réu José Nobre Guimarães, cujo depoimento restou gravado em forma de áudio e vídeo, cuja mídia encontra-se encartada nos autos e sob custódia da Secretaria da 10ª Vara.
Conforme termo da audiência realizada no Juízo da Comarca de Aracati, acostado à fl. 5.493, procedeu-se à oitiva dos réus José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima, conforme mídia que se encontra em envelope encartado à fl. 5.494 dos autos.
Na audiência realizada às 17:00 h do dia 11/05/2012, conforme termo de fls. 5.526/5.527, colheu-se o depoimento pessoal do réu José Nobre Guimarães, com gravação de imagem e som em mídia que se encontra sob custódia da Secretaria da 10ª Vara, conforme certidão de fl. 5.531, tendo sido na mesma oportunidade declarado o encerramento da fase de instrução e oportunizada a apresentação de razões finais na forma de memoriais escritos, segundo cronograma estabelecido.
Memoriais do Ministério Público Federal junto às fls. 5.535/5.561, pugnando pela absolvição dos réus Cláudio Vasconcelos Frota, Francisco de Assis Germano Arruda, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães, Victor Samuel Cavalcante da Ponte e Enphase Projetos de Investimento e Consultoria Ltda, e pela condenação dos réus José Nobre Guimarães, Kennedy Moura Ramos, Roberto Smith, José Adalberto Vieira da Silva, Raimunda Lúcia Pessoa de Lima, Cia Técnica de Engenharia Elétrica (ALUSA S.A.) e STN - Sistema de Transmissão Nordeste.
Alegações finais dos réus: Kennedy Moura Ramos colacionadas às fls. 5.582/5.672; Francisco de Assis Germano Arruda junto às fls. 5.616/5.622; Roberto Smith, Victor Samuel Cavalcante da Ponte, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Cláudio Vasconcelos Frota acostadas às fls. 5.627/5.657.
O réu José Guimarães informou a não apresentação de razões finais à fl. 5.659, em razão de ter sido excluído do polo passivo da presente ação de improbidade por decisão unânime prolatada nos Recurso Especial nº 1.206.729- CE (2010/0140236-6), cujos termos impressos foram juntados às fls. 5.783/5.842 dos autos.
Memoriais dos réus José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima encartados às fls. 5.664/5.686; do consórcio STN - Sistema de Transmissão Nordeste S/A trazidos aos autos às fls. 5.692/5.701; da ré Cia Técnica de Engenharia Elétrica colacionados às fls. 5.706/5.726; da ré Ênphase Projetos de Investimentos e Consultoria LTDA junto aos autos às fls. 5.728/5.745.
É o relatório no essencial.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Importa registrar, prefacialmente, que a presente ação civil pública de improbidade administrativa foi conclusa para sentença no dia 17 de agosto de 2012 (conforme se vê à fl. 5.747), tendo estado sob jurisdição desta magistrada, cuja lotação é a 26ª Vara Federal, da data referida até o dia 11 de setembro de 2012 (Ato nº 549/CR, de 18 de julho de 2012) e entre os dias 03 e 14 de dezembro de 2012 (Ato nº 834/CR, de 16 de outubro de 2012), totalizando, assim, 37 (trinta e sete) dias. A demora na prolação do decreto sentencial justifica-se pela extensa quantidade de cadernos processuais (26 volumes, 5.842 páginas), que bem refletem a complexidade das questões debatidas nos autos.
Dito isto, cumpre analisar as questões preliminares suscitadas pelos réus.
2.1. PRELIMINARES
2.1.1. DA INÉPCIA DA INICIAL
Embora já devidamente destramada e rechaçada tal preliminar por meio da decisão de recebimento da inicial de fls. 2.723/2.746, e bem assim daquela de fl. 4.454, em rebate aos argumentos expendidos pela Enphase Projetos de Investimento e Consultoria Ltda, no sentido de que não lhe teria sido imputada especificamente pelo Ministério Público a prática de ato que possa ser tipificado como ímprobo, considero que os fatos e fundamentos jurídicos encontram-se claramente delineados na peça vestibular, pelo que é digna de reproche a inépcia aventada. Os fatos narrados puderam ser contestados pelos réus, tanto que o fizeram nas defesas apresentadas, não se constatando, portanto, a ocorrência da mácula alegada. Com efeito, no que toca à Enphase Projetos de Investimento e Consultoria Ltda, referida empresa foi apontada como beneficiária dos atos de improbidade praticados por outros réus, na medida em que teria recebido recursos financeiros em montante superior ao contratado para a prestação de consultoria ao consórcio STN, o que, na ótica do autor da ação, seria indicativo de que os valores que suplantavam a contraprestação do contrato firmado teriam sido utilizados para pagamento de vantagens indevidas.
2.1.2. DA ILEGITIMIDADE DO MPF E DA INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
Alguns dos réus arguíram em suas contestações a ilegitimidade ad causam do Ministério Público Federal e, por consequência, a incompetência da Justiça Federal.
Com efeito, na presente ação foi apontada a prática de atos de improbidade administrativa consistentes: i) na ilegalidade da operação de empréstimo concedido pelo BNB ao consórcio STN em junho de 2004; e ii) na ilegalidade do desconto da tarifa bancária de contratação, reduzindo-a de 1,5% para 1%. Foi declinado, ainda, o beneficiamento de determinados réus mediante o recebimento de vantagens indevidas em decorrência desses atos.
Pois bem. O Ministério Público Federal possui legitimidade para questionar a regularidade da operação de empréstimo objeto da lide, uma vez que esta envolveu recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, donde patente o interesse federal a ser tutelado por meio da vertente ação civil pública de improbidade administrativa. De mais a mais, mister esclarecer que não busca o Parquet com a presente Ação de Improbidade Administrativa a tutela de interesses secundários da administração, senão a de interesse primário de toda a sociedade, consubstanciado na observância aos princípios da administração pública federal, advindo daí a sua legitimação para a causa nesse ponto. Em assim sendo, deve ser reconhecida a competência deste Juízo Federal para o processo e julgamento da ação, envolvendo os fatos aludidos.
O mesmo, contudo, não pode ser dito em relação à redução da tarifa bancária. Isso porque o titular do direito patrimonial supostamente violado é o Banco do Nordeste do Brasil - BNB, sociedade de economia mista federal, que não tem foro nesta Justiça Federal. De fato, em sendo tal tarifa destinada única e exclusivamente a remunerar o trabalho do citado banco com a análise creditícia do potencial contratante, o prejuízo pela redução indevida será experimentado pela referida pessoa jurídica.
Dito isto, hei por bem acolher a preliminar suscitada, para extinguir o feito sem julgamento do mérito no tocante ao exame da regularidade da redução da tarifa de estudo e contratação efetivada por ocasião da operação de empréstimo bancário envolvendo o BNB e a STN, com amparo no art. 267, IV do CPC.
3. MÉRITO
A Carta da República, no art. 37, caput, dispõe que a Administração Pública Direta e Indireta deve obedecer aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, ponderando, ainda, no § 4.º da mesma norma, que:
"os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, da forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível".
Na doutrina de Cristiano Chaves de Farias e Fredie Didier Jr., atos de improbidade administrativa, presentes entre os atos de imoralidade, são:
"aqueles praticados pelos agentes públicos, com desonestidade (má-fé e dolo), que importem em enriquecimento ilícito, causem prejuízo ao erário e que, independentemente do prejuízo, atentem contra os princípios da administração".1
É de todo sabido que o conceito de improbidade, assim denominado pela Carta Magna de 88 o ato lesivo à moralidade administrativa, está intimamente ligado à necessidade de o agente público atuar sempre com honestidade e em atendimento aos interesses públicos, sem aproveitar-se indevidamente dos poderes e das facilidades que lhes são conferidos no exercício de mandato, função, emprego ou cargo público.
Fixadas essas premissas, passa-se a analisar se a condutas dos réus descritas pelo Ministério Público na inicial configuram ato de improbidade passível das sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92, tal como pretendido pelo Parquet.
Antes, porém, relativamente ao acionado José Nobre Guimarães, calha destacar a sua exclusão do polo passivo da presente Ação de Improbidade, por força do julgamento definitivo do Recurso Especial nº 1.206.729-CE pelo Superior Tribunal de Justiça, interposto em face do Acórdão prolatado pelo Eg. TRF - 5ª Região em sede de Agravo de Instrumento, tendo o STJ concluído no aludido julgamento pela insubsistência da fundamentação da decisão que a recebeu relativamente ao mencionado réu, dita baseada em "meras ilações, sem qualquer amparo em prova ou mesmo indícios de que o recorrente participou dos alegados ilícitos ou deles foi beneficiado de alguma forma". Portanto, em relação a José Nobre Guimarães, sequer verificou-se o recebimento da presente Ação de Improbidade, sendo esta, em relação a ele, extinta.
Dito isto, e tendo em vista que a ação em apreço envolve não só a operação de empréstimo bancário concedido pelo Banco do Nordeste do Brasil - BNB ao consórcio SISTEMA DE TRANSMISSÃO DO NORDESTE - STN, com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, mas igualmente o beneficiamento dos réus KENNEDY MOURA RAMOS, JOSÉ ADALBERTO VIEIRA DA SILVA, RAIMUNDA LÚCIA PESSOA DE LIMA e ENPHASE PROJETOS DE INVESTIMENTO E CONSULTORIA LTDA, mediante o recebimento de vantagens indevidas, para melhor compreensão das questões, dividirei a análise do mérito em tópicos.
3.1. DA OPERAÇÃO DE EMPRÉSTIMO ENTRE BNB E STN
Narra a inicial que em junho de 2004 foi aprovada operação de empréstimo pelo BNB em favor do consórcio STN, com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, para financiamento de instalações de transmissão de energia elétrica em 500kV com origem na Subestação Teresina II e término na Subestação Fortaleza II, no valor de R$ 299.995.032,33 (duzentos e noventa e nove milhões, novecentos e noventa e cinco mil e trinta e dois reais e trinta e três centavos).
Defende, em suma, o MPF que a referida contratação somente foi possível mediante alterações das regras bancárias, e bem assim das disposições normativas do Fundo, então vigentes, tendo aquelas sido perpetradas por meio da Proposta de Ação Administrativa 2004/618-002, de 13 de abril de 2004, aprovada pela Diretoria do Banco, composta à época dos fatos pelos réus Roberto Smith (Presidente), Francisco de Assis Germano Arruda, Luiz Ethewaldo de Albuquerque Guimarães e Victor Samuel Cavalcante da Ponte (membros Diretores). De igual modo, teriam tido papel preponderante na operação aludida os réus Cláudio Vasconcelos Frota (Superintendente de Operações Financeiras, Internacionais e Corporativas do BNB), mediante a formatação da chamada "operação estruturada", a qual viabilizou o financiamento, e Kennedy Moura Ramos (assessor da Presidência do BNB), apontado como "articulador", que interagiu com os diversos setores e pessoas envolvidas na operação, e bem assim, como se verá adiante, responsável pelo recebimento da "propina" paga em razão da contratação dita irregular.
De logo afasto a alegação dos réus no sentido de não ser possível o acolhimento da pretensão formulada nestes autos, tendo em vista o Acórdão nº 2.186/2005 proferido pelo Tribunal de Contas da União - TCU no bojo da TC 012.842/2005-8, que concluiu pela regularidade da operação bancária ora verberada, assim como pela ausência de qualquer prejuízo ao erário com sua ultimação. Não bastassem a disposição encartada no art. 21 da Lei nº 8.429/92, segundo a qual a aplicação das sanções ali previstas independe "II - da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas", e a ausência de vinculação da esfera judicial ao julgamento da Corte de Contas, a própria Constituição Federal de 88 determina em seu art. 5º que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito", não havendo que se falar, pois, em insindicabilidade daquela decisão administrativa. Ademais, como o próprio Relator do acórdão aludido declinou em seu voto, a análise ali perpetrada cingiu-se "única e exclusivamente às questões técnicas suscitadas nas audiências formuladas pela Unidade Técnica, autora da representação em exame", de modo que a questão relativa à existência ou não de ofensa aos princípios que regem a Administração Pública deve e será aqui devidamente analisada. A menção feita pelo Ministro Relator em seu voto no sentido de não haver vislumbrado elementos plausíveis que indicassem a ocorrência de favorecimento decorre de mera interpretação dos fatos e indícios apurados no âmbito daquele processo administrativo, a qual, todavia, será aqui afastada.
Pois bem. Não obstante demonstrado pela análise técnica procedida pelo TCU que a operação de empréstimo objeto da lide não causou prejuízo ao erário, no entender desta magistrada houve malferimento ao princípio constitucional da impessoalidade, ocasionado por meio da aprovação Proposta de Ação Administrativa 2004/618-002, de 13 de abril de 2004.
Cumpre ressaltar inicialmente que não merecem ser acolhidas as argumentações dos réus no sentido de que a inexistência de prejuízo patrimonial seria apta a afastar a improbidade imputada, porquanto a própria legislação de regência preconiza que a aplicação das sanções ali previstas independe de "efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento" (art. 21, I da Lei nº 8.429/92). Nesse diapasão, eis o seguinte julgado:
"ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROMOÇÃO PESSOAL EM PROPAGANDA DO GOVERNO. ATO ÍMPROBO POR VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE HONESTIDADE E LEGALIDADE E ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DOLO OU CULPA. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES COMINADAS ÀS HIPÓTESES DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DO VALOR GASTO COM A PUBLICIDADE. DOSIMETRIA DA PENA.
1. Hipótese em que o Tribunal de origem reconheceu ter havido promoção pessoal dos recorridos em propaganda governamental, mas considerou a conduta mera irregularidade por ausência de dolo.
2. A conduta dos recorridos amolda-se aos atos de improbidade censurados pelo art. 11 da Lei 8.429/1992, pois atenta contra os princípios da moralidade administrativa, da impessoalidade e da legalidade, além de ofender frontalmente a norma contida no art. 37, § 1º, da Constituição da República, que restringe a publicidade governamental a fins educacionais, informativos e de orientação social, vedando, de maneira absoluta, a promoção pessoal.
3. De acordo com o entendimento majoritário da Segunda Turma, a configuração dos atos de improbidade que atentam contra os princípios da Administração Pública (art. 11) prescinde da comprovação de dolo. Precedentes: REsp. 915.322/MG (Rel. Min. Humberto Martins, j. 23/9/2008); REsp. 737.279/PR (Rel. Min. Castro Meira, j. 13/5/2008, DJe 21/5/2008).
4. Embora entenda ser tecnicamente válida e mais correta a tese acima exposta, no terreno pragmático a exigência de dolo genérico, direto ou eventual, para o reconhecimento da infração ao art. 11, não trará maiores prejuízos à repressão à imoralidade administrativa. Filio-me, portanto, aos precedentes da Primeira Turma que afirmam a necessidade de caracterização do dolo para configurar ofensa ao art. 11.
5. Ainda que se admita a necessidade de comprovação desse elemento subjetivo, forçoso reconhecer que o art. 11 não exige dolo específico, mas genérico: "vontade de realizar fato descrito na norma incriminadora". Nessa linha, é desnecessário perquirir a existência de enriquecimento ilícito do administrador público ou o prejuízo ao Erário. O dolo está configurado pela manifesta vontade de realizar conduta contrária aos deveres de honestidade e legalidade, e aos princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade.
6. No caso em tela, a promoção pessoal foi realizada por ato voluntário, desvirtuando a finalidade estrita da propaganda pública, a saber, a educação, a informação e a orientação social, o que é suficiente a evidenciar a imoralidade. Não constitui erro escusável ou irregularidade tolerável olvidar princípio constitucional da magnitude da impessoalidade e a vedação contida no art. 37, § 1º, da Constituição da República.
7. O dano ao Erário não é elementar à configuração de ato de improbidade pela modalidade do art. 11. De toda sorte, houve prejuízo com o dispêndio de verba pública em propaganda irregular, impondo-se o ressarcimento da municipalidade.
8. As penas do art. 12 da Lei 8.429/1992 não são necessariamente cumulativas. Desse fato decorre a imprescindibilidade de fundamentação da escolha das sanções aplicadas, levando-se em conta fatores como: a reprovabilidade da conduta, o ressarcimento anteriormente à propositura da Ação Civil Pública dos danos causados, a posição hierárquica do agente, o objetivo público da exemplaridade da resposta judicial e a natureza dos bens jurídicos secundários lesados (saúde, educação, habitação, etc.). Precedentes do STJ.
9. Apesar de estar configurado ato ímprobo, o acórdão recorrido deixou de analisar, de maneira suficiente, os fatos relevantes à dosimetria da sanção a ser aplicada. Assim, caberá ao egrégio Tribunal de origem fixar as penas incidentes concretamente, sem prejuízo da já determinada obrigação de ressarcimento ao Erário.
10. Recurso Especial parcialmente provido.
(RESP 200501086508, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:23/06/2010.) (sem destaques no original)
De igual modo, deve ser refutada a tese da defesa segundo a qual a efetivação de outras 24 "operações estruturadas" no exercício de 2004 no âmbito do BNB afastaria a alegada "quebra" da impessoalidade. A uma, porquanto as provas e indícios dormitantes nos autos, consoante veremos a seguir, apontam para a conclusão no sentido de que as modificações nos normativos do BNB ocorreram após a apresentação da carta consulta pela STN, refletindo a disposição dos agentes públicos em viabilizar a aprovação do financiamento em seu favor com tais alterações. A duas, porque, como aludiu o MPF em suas alegações finais, as contratações na modalidade "operações estruturadas" realizadas em datas anteriores àquela que envolveu a STN decorreram de propostas apresentadas posteriormente a deste consórcio. A três, porque a reiteração de uma irregularidade (no caso, realização de "operações estruturadas" com amparo em norma escoimada de parâmetros objetivos) não tem o condão de retirar-lhe tal pecha.
Prosseguindo, temos que a proposta de financiamento do consórcio STN foi apresentada, por meio de carta consulta, ao Banco do Nordeste do Brasil em 30 de janeiro de 2004, quando ainda não vigiam as regras relativas às "operações estruturadas", tampouco limitações do financiamento e do endividamento dos recursos do FNE que permitissem o acolhimento da proposta aludida. Após a verificação de que a análise de risco do projeto não obteve pontuação suficiente para ser submetida à deliberação pela Diretoria do Banco e, em consequência, para a concessão do crédito, em março de 2004, o Ambiente de Operações Internacionais e Corporativas do BNB promoveu uma apresentação sobre a "Estruturação da Operação de Financiamento em favor da STN", em que foram explicitadas as características da proposta de financiamento do referido consórcio, assim como lançado o conceito de "operação estruturada" com recomendações da área de negócios, cujo atendimento se mostrava necessário a viabilizar a operação. Tais recomendações foram acatadas na 3.000ª reunião extraordinária da Diretoria do Banco, de 13 de abril de 2004, na qual foi aprovada Proposta de Ação Administrativa 2004/618-002.
Ora, o empréstimo concedido pelo BNB ao consórcio STN somente foi possível mediante a introdução em seus normativos internos, mais precisamente a acima mencionada Proposta de Ação Administrativa, dessa nova modalidade bancária denominada "operação estruturada", a qual, em linhas gerais, refere-se a "financiamentos com características especiais e diferenciadas que requerem um atendimento específico a cada operação, cuja tipologia e fluxo de processo possuem rito próprio, descritos na referida proposta" (acórdão 2.186-2005-TCU). Por meio desse tipo de operação, em que são enquadrados aqueles projetos de grande monta, é possível a efetivação de uma avaliação complementar da classificação global de risco da proposta de crédito, a ser realizada pela área de operações financeiras, internacionais e corporativas do Banco, permitindo sua apreciação pela Diretoria. Foi o que ocorreu em relação à proposta de financiamento do STN, que, após ser enquadrada como "operação estruturada", foi submetida a nova avaliação de risco e, posteriormente, devidamente aprovada pela Diretoria do BNB.
Viabilizou igualmente o financiamento hostilizado a alteração efetivada pelo Ministério da Integração Nacional, após solicitação do BNB, dos limites de endividamento e de participação do FNE nos empréstimos com os recursos do Fundo. Vejamos os fatos constatados pela equipe da SECEX/CE, que realizou inspeção no BNB, dando origem ao processo administrativo que tramitou no TCU:
"Observe-se que referida solicitação (alteração do limite de endividamento dos recursos do FNE) se deu cerca de um mês após o ingresso da carta-consulta do consórcio STN, em 30-1-2004 (fl. 13 do Anexo I) solicitando o empréstimo. A única operação beneficiada com essa alteração foi essa referente ao STN, ou seja a alteração visava contemplar essa empresa, tendo em vista o montante do financiamento pleiteado"
"Essa alteração, entretanto, não foi suficiente para permitir a contratação da STN, de modo que outra excepcionalidade foi pleiteada pelo Banco junto àquele Ministério, desta feita já explicitando tratar-se da operação ora em comento, em que o financiamento demandado representava 73,4% dos investimentos totais do projeto, quando a Programação do FNE permitia para o programa de infra-estrutura (PRO-INFRA), no qual se inseria a operação, apenas 70%. A defesa junto ao MIN era simplista no sentido de afirmar que a extrapolação era de apenas 3,4%, que o BNDES permitia um limite de 80% e que se tratava de operação para viabilizar infra-estrutura de transmissão de energia elétrica"
"Na realidade, a alteração não foi feita porque o FNO tinha limite diferenciado - tanto que o limite para o FCO não foi aumentado, mas a alteração se deu para beneficiar a operação com a STN"
"(...) as alterações dos limites estabelecidos na Programação do FNE foram feitas com o fim específico de viabilizar a contratação com a Empresa STN"
"O que se observa é que a nota (de classificação global da proposta) foi melhorada de modo subjetivo (...)"
O financiamento em questão foi da ordem de 300 (trezentos) milhões reais, o maior financiamento concedido no ano de 2004, aprovado na 3.014ª reunião de Diretoria do BNB, em data de 25.06.2004. Dos dados apresentados pelos próprios Diretores, Superintendente e Presidente do Banco, na manifestação de fls. 1477/1641, especificamente da tabela de fl. 1559, pode-se inferir o seguinte:
a) foi o maior financiamento do ano de 2004, talvez o maior financiamento concedido com recursos do FNE: para se ter uma idéia, o segundo maior financiamento foi concedido no valor de 183 (cento e oitenta e três) milhões de reais;
b) a retirada do limite do financiamento a 10% (dez por cento) do valor total do projeto, quando utilizado mais de 1,5% (um e meio por cento) do patrimônio do fundo, através da Nota Técnica nº 05/GFC/DFC, de 05.03.2004, e o aumento do limite de 70% (setenta por cento) para 75% (setenta e cinco por cento) do valor total do projeto, através da Nota Técnica nº 23/DFD, de 15.06.2004, deram-se dias antes da aprovação do financiamento pela Diretoria do Banco, de modo a possibilitar a operação da STN;
c) assim como a alteração dos limites do financiamento, a adoção de novos critérios para análise do risco da operação, por meio da Proposta de Ação Administrativa nº 2004/618-002, aprovada em 13.04.2004, na 3000ª Reunião de Diretoria, ocorreram entre o protocolo da carta consulta ao BNB para contratação do financiamento, em 30.01.2004, e a aprovação do financiamento, em 25.06.2004;
d) foi o único financiamento no período que ultrapassou o percentual de 70% (setenta por cento) do valor total do projeto;
e) foi igualmente o único financiamento que ultrapassou o percentual de 1,5% (um e meio por cento) do patrimônio do FNE, chegando a 1,92% (um vírgula noventa e dois por cento do patrimônio do fundo); o segundo maior financiamento concedido, por exemplo, comprometeu apenas 1,17% (um vírgula dezessete por cento) dos recursos do fundo.
Conquanto se possa atribuir a tais condutas o enveredamento de um "esforço institucional do BNB, em ingressar em novas searas comerciais" (na esteira da conclusão do acórdão 2.186-2005-TCU), o fato é que, por mais vantajoso que fosse para a instituição adotar providências aptas a viabilizar a operação, não poderia o Banco ter assim agido visando à aprovação de determinada proposta de financiamento. Com efeito, as regras do jogo não podiam ser modificadas depois que ele começou. Em assim procedendo, o BNB, por meio de sua Diretoria, culminou por não obedecer ao princípio da impessoalidade, principalmente se levarmos em consideração que os atos praticados para possibilitar a realização da operação de empréstimo foram embasados em norma criada para esse fim sem parâmetros objetivos pré-estabelecidos, o que foi reconhecido pelo próprio BNB, que se comprometeu, no curso dos procedimentos que tramitaram perante o TCU, a adotar as medidas necessárias à atualização de seu Manual de Procedimentos - Risco de Crédito, expurgando as pechas de irregularidade constatadas.
O princípio da impessoalidade, encartado no caput do art. 37 da Constituição Federal de 1988, traduz um dever para a Administração, segundo o qual ela "há de ser impessoal, sem ter em mira este ou aquele indivíduo de forma especial"2.
Veja-se que o texto constitucional não traz exceções à observância dos princípios que elenca no art. 37. É dizer, não determina a Carta Magna que a Administração deve obedecer ao princípio da impessoalidade, exceto quando a inobservância trouxer-lhe vantagens lícitas. Com base nisso, uma pessoa não poderia, por exemplo, ser empossada no cargo de juiz sem concurso público, por mais qualificada e proba que fosse. Igualmente, não poderia haver a alteração de regras do edital de um certame licitatório para beneficiar determinado licitante, retirando óbices à sua contratação, ainda que ele fosse inegavelmente o melhor prestador do serviço a um menor custo.
Força concluir, pois, que a aprovação na 3000ª reunião extraordinária da Diretoria do Banco, de 13 de abril de 2004, da Proposta de Ação Administrativa 2004/618-002, efetivada pelos réus ROBERTO SMITH, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES e VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE, que viabilizou a contratação de empréstimo pela STN, deve ser enquadrada como ato de improbidade administrativa violador do princípio da impessoalidade, nos termos do caput do art. 11 da Lei nº 8.429/92, de seguinte dicção:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
Segundo a lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, para que o ato de improbidade administrativa possa acarretar a aplicação das medidas sancionatórias presentes no art. 37, § 4.º da Constituição Federal de 88, devem estar presentes determinados elementos, quais sejam: i.) o sujeito passivo ser uma das entidades mencionadas no art. 1.º da Lei n.º 8.429/92; ii.) o sujeito ativo ser um agente público ou terceiro que induza ou concorra para a prática de ato de improbidade ou dele se beneficie; iii.) a ocorrência de ato danoso causador de enriquecimento ilícito para o sujeito ativo, prejuízo para o erário ou atentado contra os princípios da Administração Pública, e; iv) a presença de elemento subjetivo: dolo ou culpa.3
O art. 1.º da Lei n.º 8.429/92 explicita quais os entes administrativos passíveis de sofrer a prática de um ato de improbidade:
Art. 1.° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.
Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.
Da leitura da peça pórtica, assim como das ponderações acima delineadas, extrai-se que o ato de improbidade praticado pelos réus ocorreu em deliberado prejuízo ao princípio da impessoalidade que deve reger a utilização dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE, o que preenche o primeiro requisito acima enumerado.
A mesma lei indica nos arts. 2.º e 3.º quem pode ser sujeito ativo de um ato de improbidade administrativa:
Art. 2.° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.
Art. 3.° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.
Presente, igualmente, esse requisito, uma vez que os réus ROBERTO SMITH, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES e VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE eram, à época da ocorrência dos atos descritos na vestibular, membros da Diretoria do BNB (o primeiro deles, Presidente, e os demais, Diretores), os quais foram responsáveis pelas decisões administrativas que viabilizaram a operação de empréstimo em favor do consórcio STN, especialmente aquela atinente à aprovação da Proposta de Ação Administrativa nº 2004/618-002.
No tocante ao réu Cláudio Vasconcelos Frota, é de ser afastada a prática de ato de improbidade, na medida em que ele, na qualidade de Superintendente de Operações Financeiras, Internacionais e Corporativas do BNB, não pode ser responsabilizado pela prática de ato que permitiu ou facilitou o financiamento objeto da lide, tendo sua atuação limitado-se ao processo de formatação da chamada "operação estruturada" em seus aspectos técnicos. A introdução dessa modalidade de operação na seara do BNB, com o intuito de possibilitar a aprovação da proposta de financiamento da STN, não lhe pode ser atribuída.
Quanto ao réu Kennedy Moura Ramos, igualmente não há como imputar-lhe o ato de improbidade ora reconhecido. É que não há lastro probatório nos autos que possa embasar uma condenação nas tenazes do art. 12 da Lei de Improbidade. Embora o MPF tenha defendido que a atuação do citado réu foi preponderante para a perfectibilização da operação de crédito impugnada, as provas oral e documental não se direcionam para o sentido apontado.
O consórcio STN, em tendo sido beneficiado pelos atos de improbidade praticados pelos agentes públicos acima mencionados, deverá ter contra si aplicadas as sanções previstas na legislação de regência, com amparo no art. 3º alhures descrito. O mesmo não se pode dizer da Companhia Técnica de Engenharia Elétrica - ALUSA S/A, uma vez que, em sendo detentora majoritária do capital social daquele consórcio, possui personalidade jurídica distinta, não havendo que ser responsabilizada sem prova de que praticou por si algum ato de improbidade ou foi ela própria beneficiária do ato.
O atentado contra os princípios da Administração Pública foi devidamente analisado, restando, assim, apurar se a sua prática ocorreu com dolo ou culpa.
Presente, igualmente, esse elemento, é dizer, o dolo, uma vez que este consiste na vontade deliberada de praticar determinada conduta, o que se verificou no caso particular, na medida em que os réus ROBERTO SMITH, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES e VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE agiram voluntariamente para o alcance do resultado pretendido, qual seja, a viabilização da operação de empréstimo do BNB para a STN. De notar que o art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige a presença de dolo específico, na esteira do precedente jurisprudencial acima transcrito (RESP 200501086508, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:23/06/2010).
O artigo 12, II da Lei nº 8.429/92 prevê as penalidades que devem ser aplicadas ao agente infrator quando da prática desses atos de improbidade, quais sejam:
Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).
(...)
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.
A jurisprudência vinha posicionando-se no sentido de ser possível a aplicação de apenas algumas das penalidades previstas na Lei de Improbidade Administrativa, quando, no caso concreto, verificar-se a desproporcionalidade entre a gravidade do ato praticado e as sanções referidas:
"ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. PRESTAÇÃO DE CONSTAS APRESENTADA FORA DO PRAZO. FALHA SANADA. EXISTENCIA DE OUTRAS IRREGULARIDADES. REALIZAÇÃO DE DESPESAS FORA DO PRAZO DOS CONVÊNIOS. ERRO NA EXECUÇÃO DAS OBRAS. NÃO APLICAÇÃO DAS VERBAS, ENQUANTO NÃO USADAS, NO SISTEMA FINANCEIRO. APROVAÇÃO ADMINISTRATIVA DAS CONTAS PELA EMBRATUR. NÃO IMPEDIMENTO DE SUA REAPRECIAÇÃO PELO PODER JUDICIÁRIO. INDEPENDÊNCIA DE INSTÂNCIAS. REJEIÇÃO DA INICIAL PELO JUÍZO A QUO. APELO CONHECIDO E PROVIDO, PARA QUE A EXORDIAL SEJA RECEBIDA.
1. Trata-se de apelação cível, interposta em face da sentença a quo (fls. 527/530), que julgou improcedente o pedido formulado no bojo de Ação Civil Pública por entender não haver ficado consubstanciado qualquer ato de improbidade praticado por parte do recorrido.
2. O art. 11, VI, da Lei nº 8.429/92, que deve ser interpretada estritamente, trata de "deixar de prestar contas", e não da prestação intempestiva das contas.
3. Contudo, apesar do encaminhamento das prestações de contas, ainda que de maneira extemporânea, deve-se atentar para a existência de outras irregularidades nos convênios referidos, como a realização de despesas fora da vigência de tais instrumentos, nos valores de R$20.933,39 (convênio 109/99) e de R$9.572,75 (convênio 145/98), os erros ocorridos na execução das obras e não aplicação os recursos federais repassados, enquanto não utilizados, no sistema financeiro, com evidências de prejuízo ao erário e subsunção dos atos, em tese, ao art. 10 XI da Lei nº 8.429/92.
4. A aprovação formal das prestações de contas pelo Órgão Concedente não exclui a possibilidade de apreciação judicial dos fatos, diante da independência das instâncias.
5. O art. 5º, inciso XXXV, da CF/88, dispõe que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
6. Ainda que se admita, em tese, que as sanções previstas no art. 12, da Lei nº 8.429/92, são bastante duras, somente devendo ser aplicadas aos casos mais graves, nada impede que o Magistrado, ao final da ação, após devidamente esclarecidos, em instrução regular, os fatos imputados, venha a aplicar, excepcionalmente, somente algumas delas, com base no principio da proporcionalidade, fixando as reprimendas segundo a natureza e a gravidade das infrações cometidas.
7. Apelação Cível conhecida e provida, de sorte a que seja recebida a petição inicial e se dê prosseguimento ao processo, até final sentença". (TRF5 - AC 409933/CE, Primeira Turma, Relator Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, j. 24/01/2008, DJ 28/03/2008)
"AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, VI, DA LEI N° 8.429/92. DEIXAR DE PRESTAR CONTAS DE VERBAS FEDERAIS RECEBIDAS DENTRO DO PRAZO ESTIPULADO. AUSÊNCIA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E DE DANO PATRIMONIAL CAUSADO AO ERÁRIO. COMINAÇÃO EXCLUSIVA DE PENA DE MULTA. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. VALOR FIXADO DENTRO DO PERMISSIVO LEGAL INSCULPIDO PELO ART. 12, III, DA LEI N° 8.429/92. SENTENÇA QUE SE MANTÉM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO IMPROVIDO.
- Prefeito municipal que, nesta qualidade, deixa de prestar contas dentro do prazo estipulado de verbas federais recebidas pratica o ato de improbidade previsto pelo art. 11, VII, da Lei n° 8.429/92.
- A multa civil é a menor e menos grave dentre as sanções impostas a funcionário público em resposta à prática de ato de improbidade administrativa.
- No caso dos autos, foi a pena de multa exatamente a única aplicada ao apelante, justamente porque o magistrado levou em conta o fato daquele não ter se enriquecido ilicitamente em decorrência do ato de
improbidade ou causado dano patrimonial ao erário, prestigiando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
- Ademais, conforme comanda o art. 12, III, da Lei n° 8.429/92, a multa civil pode ser cominada em até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente. Ou seja, o magistrado, dentro do permissivo legal ora destacado, poderia ter cominado multa de até R$
185.952,00. Se optou por cominar R$ 10.000,00, tal medida, além de legal, se mostrou também razoável, já que quase 19 vezes inferior ao valor máximo que poderia ser fixado.
- Sentença que se mantém por seus próprios fundamentos.
- Apelação improvida". (TRF5, AC 326375/CE, Primeira Turma, Relator Desembargador Federal Cesar Carvalho, j. 02/08/2007, DJ 17/9/2007)
Tal entendimento foi corroborado pela alteração legislativa no caput do art. 12 operada pela Lei nº 12.120/2009, que passou a possibilitar a aplicação das sanções de forma isolada ou cumulativa, considerando a gravidade do fato.
In casu, não resta incólume de dúvidas o favorecimento do consórcio STN, ocasionado pelos atos ímprobos ora reconhecidos, mediante o pagamento/recebimento de vantagem indevida, tampouco a ocorrência de prejuízo financeiro. Isto porque, embora se tenha constatado a modificação das regras bancárias por meio da introdução de norma dotada de considerável carga de subjetividade, que viabilizou o acatamento da proposta de financiamento apresentada pelo consórcio STN, não restou cabalmente comprovada a apropriação ou o desvio em proveito próprio ou alheio dos recursos do FNE, ou mesmo o pagamento de vantagem indevida aos agentes públicos que praticaram os atos de improbidade alhures descritos. Na verdade, da análise dos documentos constantes nos autos, especialmente o acórdão do TCU, quer parecer que a contratação foi efetivada praticamente sem risco negocial, conquanto desassociada, repise-se, do preceito constitucional constante no caput do art. 37 da CF/88 (princípio da impessoalidade).
De igual modo, pela baixa lesividade da conduta, também entendo inaplicáveis as penalidades de perda da função pública, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.
Do cotejo das provas que instruem os autos aliado às razões acima explicitadas, tenho como razoável e proporcional a condenação dos réus, na presente hipótese, no pagamento de multa civil.
3.2. DA PERCEPÇÃO DE VANTAGENS INDEVIDAS
Como já adiantado acima, não restou cabalmente demonstrada nos autos a percepção de vantagens indevidas em decorrência da viabilização da operação de crédito envolvendo o BNB e o STN.
Em primeiro lugar, a empresa Enphase Projetos de Investimento e Consultoria LTDA, contratada pelo STN para a elaboração do projeto de financiamento, foi apontada como beneficiária dos atos de improbidade praticados no âmbito da aludida operação bancária na medida em que teria recebido recursos financeiros em montante superior ao contratado, o que, na ótica do autor da ação, seria indicativo de que os valores que suplantavam a contraprestação do acordo firmado teriam sido utilizados para pagamento de vantagens indevidas. Entretanto, não foi produzida prova que demonstrasse a veracidade das alegações pórticas. Na verdade, há nos autos comprovação de que o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) constante na proposta de financiamento como remuneração da referida empresa decorreu da limitação do montante financiável, não refletindo a remuneração fixada com esteio no livre pacto entre os contratantes e em conformidade com as condições normais do mercado. Desse modo, não deve ser acolhida a pretensão deduzida em face da referida empresa.
Seguindo na análise dos demais fatos, verifica-se que o Ministério Público Federal pretendeu estabelecer uma conexão entre o financiamento concedido ao SISTEMA DE TRANSMISSÃO DO NORDESTE - STN e a prisão em flagrante de JOSÉ ADALBERTO VIEIRA, portando o valor de US$ 100,599.00 (cem mil, quinhentos e noventa e nove dólares americanos) e mais R$ 209.000,00 (duzentos e nove mil reais) sem qualquer comprovação de origem. Argumentou o MPF que referido montante fora recebido das mãos de José Petronilho de Freitas, um dos Diretores da Companhia Técnica de Engenharia Elétrica - ALUSA S/A, ora ré e que, por sua vez, é acionista majoritária do consórcio STN, em retribuição à prática de atos que possibilitaram a perfectibilização do financiamento concedido pelo BNB ao STN. A facilitação da contratação teria sido providenciada por Kennedy Moura Ramos, assessor da Presidência do BNB, filiado ao PT e amigo de José Nobre Guimarães e de José Adalberto Vieira, tendo deste recebido, inclusive, várias ligações por ocasião de sua prisão em posse do dinheiro aludido.
Deixo de aplicar a pena de confesso aos réus José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima, diante do disposto no art. 347, I do Código de Processo Civil. Embora não haja certeza sobre o caráter criminoso de suas condutas, uma vez que não há notícias nos autos sobre o andamento da ação penal movida contra ambos em decorrência dos fatos praticados e que também são objeto da presente lide, e mesmo diante da defesa apresentada no bojo daquele processo no sentido de que a conduta seria atípica, não há como se afastar a torpeza desta, dada a situação vexatória de repercussão nacional em que foi apreendido o dinheiro. Nesse diapasão, trago à lume o escólio de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, que, ao tecerem comentários à referida norma, afirmaram que: "ninguém é obrigado a (...) desmoralizar a própria imagem (art. 5º, X, CRFB)"4.
Pois bem. O conjunto probatório não induz à conclusão de que o dinheiro apreendido em posse de José Adalberto Vieira da Silva ou mesmo aqueles valores depositados na conta bancária de Raimunda Lúcia Pessoa de Lima e o carro adquirido por esta são oriundos do pagamento de vantagem indevida pelo STN ou pela ALUSA, com vistas à obtenção do financiamento junto ao BNB.
Nenhum dos réus ouvidos confirmou a versão ministerial, tampouco as testemunhas arroladas. Certo é que o MPF fez menção a depoimentos colhidos no processo administrativo que foi instaurado no âmbito da Procuradoria da República. No entanto, tais depoimentos não foram submetidos ao contraditório, pelo que, ainda que tivessem sido concludentes no sentido apontado pelo Ministério Público, não poderiam embasar o acolhimento do seu pleito.
Dispõe o Código de Processo Civil, em seu art. 332, que "todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa".
Com base nisso, tem-se que é possível a utilização da prova indiciária no âmbito do processo civil, cuja definição encontra-se no art. 239 do Código de Processo Penal: "considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias".
Pergunta-se: seria possível o acolhimento da pretensão deduzida nestes autos com amparo na prova indiciária? No caso concreto, não. É que as circunstâncias provadas no decorrer da instrução, quais sejam: o transporte de vultosa quantia de dinheiro de forma sorrateira e sem comprovação de origem realizado por José Adalberto Vieira da Silva; o recebimento desse dinheiro do Sr. José Petronilho de Freitas; as ligações telefônicas havidas entre referidos senhores e entre eles e Kennedy Moura Ramos; a aquisição por José Adalberto Vieira da Silva de passagens aéreas para São Paulo e de veículo automotor novo, além de sua defesa ser realizada por advogado de renome, tudo isso incompatível com seus rendimentos como assessor parlamentar e, ao que consta, ora desempregado, dentre outros elementos, não teriam o condão de autorizar a conclusão de que houve o pagamento de vantagem indevida em retribuição à viabilização da operação de empréstimo envolvendo o BNB e o STN. Vejamos:
1) Não há contemporaneidade entre a aprovação do financiamento e a apreensão do dinheiro: enquanto aquela ocorreu em junho de 2004, esta verificou-se em julho de 2005;
2) Ainda que se considerasse que o dinheiro apreendido em julho de 2005 em poder de José Adalberto Vieira da Silva consistia em parcela da vantagem indevida previamente acertada, não há elementos de prova que indiquem o pagamento de parcela anterior. Mesmo os depósitos efetivados na conta bancária da demandada Raimunda Lúcia Pessoa de Lima, nos valores de R$ 4.000,00 e R$ 19.000,00, e a compra do carro em seu nome ocorreram em 2005, bastante tempo após a contratação do empréstimo e a liberação das primeiras verbas;
3) Os réus José Adalberto Vieira da Silva e Raimunda Lúcia Pessoa de Lima não tinham nenhuma relação com os agentes públicos ora condenados. O primeiro era, ao que parece, amigo do réu Kennedy Moura Ramos, cuja responsabilidade pela prática do ato de improbidade administrativa, todavia, foi afastada na presente decisão. Ora, se não houve comprovação de que o réu Kennedy Moura Ramos foi responsável pela prática de ato tendente a viabilizar a operação de crédito objeto da lide, de igual modo não há como concluir pelo recebimento por ele, através de interposta pessoa (no caso, José Adalberto), de vantagem indevida em decorrência de conduta não realizada;
4) A entrega do dinheiro a José Adalberto por José Petronilho de Freitas parece estar demonstrada, diante do contexto fático em que ocorreu a ação, é dizer, o encontro entre ambos foi confirmado e registrado pelo sistema de segurança do prédio em que ocorreu, além do tempo que levou e o itinerário de José Adalberto naquele dia. No entanto, não ficou comprovado que José Petronilho de Freitas agiu em nome da Companhia Técnica de Engenharia Elétrica - ALUSA S/A, detentora majoritária do capital social do STN.
Especificamente no que tange à conduta do réu José Adalberto Vieira da Silva, tem-se que a origem do dinheiro transportado, repise-se, ardilosamente, não foi por ele nem de longe demonstrada, não havendo justificativa plausível para tanto, especialmente do ponto de vista moral. É possível que tenha origem ilícita? Força dizer que sim. Nada obstante, por tudo o quanto foi explanado, não há como concluir sem pecha de incerteza pela relação desse dinheiro com os fatos descritos na inicial. Nada obsta que a apuração na seara criminal tenha desfecho distinto, ou mesmo que futuramente se possa estabelecer uma relação entre tal montante e outro ilícito de natureza administrativa ou penal. Ocorre que, nos termos do disposto nos artigos 2º, 128 e 460 da Lei Adjetiva Civil, o juiz está adstrito aos limites em que proposta a demanda (princípio dispositivo), de modo que não me cabe aqui decidir sobre pedido e/ou causa de pedir distinta da que consta na petição inicial.
O magistrado, na difícil e por vezes tortuosa missão de decidir, não pode apreciar os casos submetidos ao seu julgamento imbuído de sentimentos pessoais, tampouco com opiniões formadas a partir de análises feitas pela população em geral do que aconteceu ou poderia ter acontecido. O magistrado deve ater-se às provas coletadas nos autos, observando sempre os direitos e garantias constitucionais, em especial o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Afastar-se de tais premissas é pôr em risco o próprio Estado Democrático de Direito.
Assim, o que se infere no caso particular é a inexistência de harmonia nas provas de forma a possibilitar uma condenação pelo recebimento de vantagem indevida.
Desta feita, conclusão em sentido contrário, é dizer, para reconhecer que houve pagamento/recebimento de vantagem indevida, basear-se-ia em mera suposição, o que não é cabível, especialmente se levarmos em consideração a natureza gravosa das sanções impostas pela Lei nº 8.429/92.
D I S P O S I T I V O
À luz do exposto e de tudo o mais que dos autos consta, julgo PROCEDENTE EM PARTE A PRETENSÃO AUTORAL, tão somente para condenar os demandados ROBERTO SMITH, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES, VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE e SISTEMA DE TRANSMISSÃO DO NORDESTE - STN no pagamento de multa civil, fixada nos seguintes patamares:
1) Para os réus ROBERTO SMITH, FRANCISCO DE ASSIS GERMANO ARRUDA, LUIZ ETHEWALDO DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES e VICTOR SAMUEL CAVALCANTE DA PONTE no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em desfavor de cada um;
2) Para o réu SISTEMA DE TRANSMISSÃO DO NORDESTE - STN no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).
No tocante ao exame da regularidade da redução da tarifa de estudo e contratação efetivada por ocasião da operação de empréstimo bancário envolvendo o BNB e o STN, EXTINGO O FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO nos termos do art. 267, IV do CPC.
Custas pelos demandados, ora condenados.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Fortaleza, 14 de dezembro de 2012
DÉBORA AGUIAR DA SILVA SANTOS
Juíza Federal Substituta da 26ª Vara no exercício
cumulado da jurisdição da 10ª Vara
CERTIDÃO
Certifico que esta Sentença foi registrada
no sistema TEBAS nesta data. Dou fé.
Fortaleza, de dezembro de 2012.
Servidor Responsável
1 In Procedimentos especiais cíveis: legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 1140.
2 In CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª edição, Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2006, p. 17.
3 In Direito administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 705.
4 In Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. 3ª edição revista, atualizada e ampliada, São Paulo: RT, 2011, p. 352.
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2000.81.00.026016-9
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0017764-94.2005.4.05.8100
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Secção Judiciária do Estado do Ceará - 10ª Vara
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