A rede de dormir adquiriu novos significados e desdobramentos imprevistos pelas lentes da fotógrafa Sheila Oliveira. Ao lado da jornalista Claudia Albuquerque, elas percorreram o Ceará em busca dos artesãos e operários desse antigo e sempre moderno jeito de sonhar. Legado indígena, transformado por mãos portuguesas e afinado em perfeito acorde nordestino, o objeto de dormir se transformou em livro, que será lançado em Fortaleza. O livro fotográfico “Redes de dormir” (D'artista Editora, 124 páginas, R$ 50,00) será lançado no 1º de setembro, na Galeria Mariana Furlani (Rua Canuto de Aguiar, 1401, Fortaleza-CE).
Segundo a pesquisa do livro, a primeira menção ao objeto em língua portuguesa foi feita em 1500 por Pero Vaz de Caminha, na sua famosa carta a El-Rei D. Manuel. Era uma segunda-feira, dia 27 de abril, quando os portugueses visitaram pela primeira vez uma povoação indígena de nove ou dez casas – “tão comprida cada uma como esta nau capitânia”. As habitações eram cobertas de palha, com portas pequenas, acolhendo cada qual 30 ou 40 índios. “Tinham dentro muitos esteios; e, de esteio a esteio uma rede atada pelos cabos, alta, em que dormiam, e, debaixo, para se aquentarem, faziam seus fogos”. Apelidada de “rede” aquele leito atado pelos cabos, devido à semelhança com o apetrecho de pesca, que os portugueses tão bem conheciam pelo uso indígena.
“Depois da farinha de mandioca a rede foi o primeiro elemento de adaptação, de acomodação, de conquista do português”, comenta o pesquisador Câmara Cascudo, no seu clássico “Rede de Dormir”. Pegando emprestado o nome famoso, a fotógrafa paulista, residente no Ceará, Sheila Oliveira saiu em expedição pelo Estado, ao lado da jornalista Cláudia Albuquerque, e registrou em imagens as muitas facetas do objeto.
“Quem mergulha no universo das redes descobre que todas elas têm nome. Na fábrica da Multicor, o visitante indeciso é capaz de passar horas para escolher o seu leito móvel, dada a quantidade de opções”, informa no livro a jornalista. A varanda, a franja, a padronagem, a textura, a trança ou a grade definem os estilos de redes fabricados artesanalmente por todo o Estado. Os nomes são dados a partir dos detalhes, para diferenciar o produto e seduzir os compradores. “Tem rede Imperatriz, Princesinha, Açucena,Fortaleza, Veraneio, Deus é Fiel, Lampião, Maria Bonita, Jaguar...”, enumera. No percurso, as duas ainda descobriram que para o cálculo do preço, leva-se sempre em conta o peso da rede. “Quanto maior o peso da peça, melhor a qualidade do fio, portanto, mais caro o produto”, apontam.
O livro é apresentado pelo professor e pesquisador em cultura popular, Gilmar de Carvalho, que convida os leitores para o deleite visual que se segue nas 124 páginas da publicação. “O convite é para que embarquemos nessa aventura, de preferência deitados em uma rede que nos acolha, nos abrace e nos deixe felizes de saber que tem quem faça da rede um objeto de fruição estética, como Sheila Oliveira fez nesse livro referencial”, descreve.
Para a fotógrafa, que tem raiz cearense, a viagem tem um tom emocional. “Lembrei das brincadeiras de balançar na rede com os meus irmãos, da minha mãe dando a mamadeira de mingau para a minha irmã caçula no balanço da rede... Às vezes era eu quem dava a mamadeira... Imagens de redes armadas nas varandas da casa do sertão dos meus avós maternos – quando íamos passar as férias em Itapipoca – e tantas outras". As cidades de Jaguaruana, Beberibe, Icapuí, Santana do Cariri, Aiuaba, Várzea Alegre, Potengi, Irauçuba, Juá, São Gonçalo, Itarema, Fortaleza passaram pelo roteiro e compõem este ensaio fotográfico e sentimental do objeto de sonhar.
A autora – Sheila Oliveira estudou fotografia na Foximage, em Paris, e fez especialização em fotojornalismo em São Paulo, na Escola Focus. Trabalhou na Agence France Press – AFP ( Paris) e no jornal Folha de São Paulo. Em 2005 ganhou o Prêmio de Fotografia Chico Albuquerque, da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará com o livro “Carnaúba a Árvore que Arranha”, Editora Tempo D’imagem, seu primeiro livro, e em 2012, ganhou o prêmio do Edital das Artes da Secultfor com o livro “Redes de Dormir”. Foi Diretora/Presidente do Ifoto – Instituto da Fotografia de 2010/2011.
Serviço - Redes de dormir (D'artista Editora, 124 páginas, R$ 50,00) - Lançamento do livro e abertura da exposição da fotógrafa Sheila Oliveira. De 1º a 15 de setembro de 2012, das 9 às 13h, na Galeria Mariana Furlani (Rua Canuto de Aguiar, 1401).
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